Segurança no Consumo de Moluscos Bivalves

Moluscos bivalves são animais formados por uma concha, constituída de duas valvas, que habitam as águas, além disso são organismos filtradores, tais como ostra, mexilhão, vieira, sururu, amêijoa, entre outros. São amplamente produzidos e consumidos pela China, sendo atualmente o maior exportador mundial, embora outros países como o Chile, o Japão, a Coreia do Sul e a Espanha também possuam uma produção significativa (FAO, 2020). 

O Brasil ocupa o segundo lugar em cultivo de moluscos bivalves na América Latina. Santa Catarina é o estado onde a produção é mais destacada, correspondendo a 95% da produção nacional (GARBOSSA et al., 2014). Em outras regiões o consumo é baixo, geralmente ocorrendo durante o verão e em cidades litorâneas. 

Os bivalves podem ser consumidos de várias formas: in natura, gratinado, a vinagrete, ao bafo, sob a forma de risoto ou ensopado, em pratos tais como a caldeirada e o sururu de capote. A ostra, por exemplo, é amplamente consumida na forma crua, o que gera uma preocupação ainda maior com relação à sua origem. Isso porque devido à sua capacidade filtradora, os moluscos bivalves são capazes de acumular substâncias e agentes patogênicos presentes na água, tais como vírus, bactérias, protozoários, biotoxinas produzidas por microalgas e elementos traço, antigamente conhecidos como metais pesados. 

No geral, a contaminação dos moluscos bivalves está intimamente relacionada à qualidade da água de seu habitat. Alguns organismos, como as ostras, por exemplo, podem filtrar até 10 litros de água por hora (LEGAT et al., 2008). Desse modo, substâncias presentes na água são acumuladas nos moluscos bivalves em decorrência da filtração e podem causar danos à saúde do consumidor, que variam desde sintomas gastrointestinais leves, como náusea, vômitos, diarreia e cólicas abdominais, até sinais neurológicos, que podem evoluir para coma e morte. Por isso, a origem dos moluscos bivalves é fundamental e determinante para garantia da sua inocuidade.

Visando garantir a segurança do consumidor e minimizar os riscos associados ao consumo de bivalves, foi criado em 2012 o Programa Nacional de Controle de Moluscos Bivalves (PNCMB), que tem a finalidade de realizar o monitoramento dos bivalves que serão destinados ao consumo humano, bem como das águas de onde são retirados. Dessa forma, o PNCMB pode liberar, suspender ou liberar sob condição a retirada de moluscos bivalves baseados nos níveis de biotoxinas e de Escherichia coli (BRASIL, 2012). 

Biotoxinas são substâncias produzidas por microalgas, especialmente os dinoflagelados, que podem causar toxicidade no ser humano e provocar danos em diversos órgãos. O PNCMB descreve cinco tipos de intoxicações causadas pela ingestão de ficotoxinas: intoxicação paralisante (PSP) pela ingestão de saxitoxinas; intoxicação diarreica (DSP) causada pelo ácido ocadáico, dinofisistoxinas e yessotoxinas; intoxicação amnésica (ASP) devido à ingestão de domóico; intoxicação neurológica (NSP) pela ingestão de brevetoxinas e intoxicação causada pelo consumo de azaspirácidos (AZP) (BRASIL, 2012). 

Fonte: Brasil, 2012

A Escherichia coli é uma bactéria pertencente ao grupo conhecido como coliformes termotolerantes, pois é capaz de se multiplicar a temperatura de 44,5-45,5°C, sendo mais alta que para a maioria dos coliformes. É exclusivamente de origem fecal e também pode ser patogênica para o homem. Concomitantemente há o perigo associado à presença de genes de resistência a diversos antimicrobianos em E. coli isoladas de águas e de bivalves. Assim, o monitoramento de E. coli é fundamental visto que a presença desse microrganismo pode indicar uma possível contaminação causada pela descarga de esgotos domésticos nas águas onde os bivalves são retirados. Por isso, é utilizado como o microrganismo de predileção para análises de monitoramento de contaminação ambiental no ambiente aquático, sendo que o limite de coliformes termotolerantes é um dos parâmetros estabelecidos na resolução n° 375/2005 do CONAMA para determinar a classificação e qualidade das águas (CONAMA, 2005).

Ainda sob o ponto de vista microbiológico, só que em outra ótica, visando garantir a inocuidade do produto, a Instrução Normativa nº 60, de 23 de dezembro de 2019, da Anvisa determina os padrões em bivalves para bactérias, tais como Salmonella, E. coli e Staphylococcus coagulase positiva (BRASIL, 2019). 

n = Número de unidades amostrais; c = Unidades acima do qual o resultado é positivo; m= limite que, em um plano de três classes, separa unidades amostrais de “Qualidade Aceitável” aquelas de “Qualidade Intermediária” e que, em um plano de duas classes, separa unidades amostrais de “Qualidade Aceitável” daquelas de “Qualidade Inaceitável; M = limite que, em um plano de três classes, separa unidades amostrais de “Qualidade Intermediária” daquelas de “Qualidade Inaceitável”. Fonte: adaptado de Brasil, 2019.

Esses padrões descritos pela legislação para monitoramento higienicossanitário e controle de qualidade são medidas preventivas realizadas por órgãos competentes para evitar que o consumo de moluscos bivalves possa causar algum dano à saúde. Além de análises laboratoriais, a avaliação sensorial de frescor também é um fator que precisa ser observado pela fiscalização e população no mercado varejista. As características sensoriais devem ser analisadas no momento da compra do produto in natura, que incluem, segundo o Regulamento Técnico de Inspeção Industrial e Sanitária dos Produtos de Animal (RIISPOA), a compra do animal vivo, com as valvas fechadas, carne úmida, de aspecto esponjoso e bem aderida, com odor e coloração característicos e retenção de água límpida no interior das conchas (BRASIL, 2020). 

Sendo assim, apesar de serem produtos pesqueiros muito consumidos tradicionalmente por uma parcela de consumidores, os moluscos bivalves podem trazer riscos na sua ingestão. Portanto, a adoção de boas práticas higienicossanitárias desde a produção até a comercialização é fundamental para garantir um produto seguro. O pleno funcionamento do PNCMB é de suma importância para assegurar a qualidade; enquanto isso, produtos fiscalizados por serviços de inspeção trazem maior segurança ao consumidor. Para aquisição de produtos frescos ou em restaurantes, a preocupação com a procedência e avaliação de qualidade são importantes, assim como buscar consumir moluscos bivalves que passaram pelo tratamento térmico podem reduzir os riscos.

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 10.468, de 18 de agosto de 2020. Altera o Decreto nº 9.013, de 29 de março de 2017, que regulamenta a Lei nº 1.283, de 18 de dezembro de 1950, e a Lei nº 7.889, de 23 de novembro de 1989, que dispõem sobre o regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal. Diário Oficial da União, Brasília, 19 de agosto de 2020. 

BRASIL, Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Instrução normativa nº 60, de 23 de dezembro de 2019. Estabelece as listas de padrões microbiológicos para alimentos. Diário Oficial da União, Brasília, 26 de dezembro de 2019. Seção 1, n.249, p.133.

BRASIL. Instrução normativa interministerial nº. 07 de 08 de maio de 2012. Programa Nacional de Controle Higiênico-Sanitário de Moluscos Bivalves. Diário Oficial da União, Brasília, 09 de maio de 2012, seção 1, p. 55-59.

CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução n. 357, de 17 de março de 2005. Diário Oficial da União, República Federativa do Brasil, Brasília, DF.

FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations). The State of World Fisheries and Aquaculture 2020: Meeting the sustainable development goals. Roma: FAO, 2020. 227 p.

GARBOSSA, L.H.P.; SOUZA, R.V.; VIANNA, L.F.N.; VANZ, A.; RUPP, G.S. Moluscos bivalves: metodologia utilizada no Inquérito Sanitário das baías da Grande Florianópolis.  Florianópolis: Epagri, 2014.  44p. 

LEGAT, J. F. A.; PEREIRA, A. M. L.; LEGAT, A. P.; FAGAÇA, F. H. S. Programa de Cultivo de Moluscos Bivalves da Embrapa Meio-Norte. Teresina: Embrapa Meio Norte, 2008. 20p. 

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