Potencial prebiótico e utilização do albedo de maracujá em novos produtos

Introdução

O maracujá é uma fruta tropical muito apreciada, sendo cultivada e explorada do norte ao sul do território brasileiro. Apresenta grande importância econômica e social para o Brasil, que se destaca como o maior produtor mundial (Moura et al., 2019). As frutas provenientes do maracujazeiro amarelo possuem estrutura arredondada, com casca verde que passa à coloração amarela quando maduras. 

Aproximadamente 60% do seu cultivo no país é destinado ao consumo in natura e o restante às indústrias de processamento, sendo polpas e sucos os principais produtos. A fruta possui aroma e sabor agradáveis, além de uma grande capacidade de aproveitamento industrial, o que viabiliza a elaboração de vários produtos (Ferreira; Antunes, 2019). O maracujá possui pH de aproximadamente 2,67 a 3,77 sendo considerada uma fruta ácida, com características desejáveis para a elaboração de doces e derivados. Ainda possui diversos nutrientes, como vitamina C e do complexo B e sais minerais, fibras e propriedades calmantes, devido aos alcalóides e bioflavonóides, que agem no sistema nervoso (Moura et al., 2019). 

Em relação à qualidade física, os maracujás possuem cerca de 150 g de peso, sendo que 30% são compostos pela casca (epicarpo) e albedo (mesocarpo), 25% endocarpo e arilo carnoso (polpa), 25% pelas sementes e 20% pelo suco, aproximadamente, representando uma quantidade significativa de resíduos (Santos et al., 2019).

Fonte: Autores.  /  Figura 1. Representação das partes do maracujá. 

O potencial nutricional de sua casca é reconhecido, podendo ser aproveitada em função do elevado teor de fibras, sendo significativo o teor de fibras insolúveis; além do albedo, que corresponde à camada interna branca da casca que é rica em fibras solúveis, especialmente a pectina, e que auxilia na redução dos níveis de glicose no sangue, fonte de vitamina B3, cálcio e fósforo, demonstrando diversos benefícios para o organismo humano. A pectina é um polissacarídeo complexo utilizado na indústria de alimentos como agente estabilizante ou gelificante e apresenta potencial prebiótico.

Os prebióticos são componentes alimentares não digeríveis, mas fermentados pela microbiota intestinal, estimulando sua multiplicação, sendo responsáveis por vários benefícios à saúde, sobretudo do trato intestinal. Segundo Kolida e Gibson (2011), os principais prebióticos utilizados pela indústria mundial de alimentos são os fruto-oligossacarídeos (FOS), galacto-oligossacarídeos (GOS), xilo-oligossacarídeos (XOS), isomalto-oligossacarídeos (IMO) e inulina. Muitos alimentos de origem vegetal como cebola, alho, maçã, banana, cevada, raiz da chicória, alcachofra, aveia, trigo, além do albedo de maracujá, são fontes de prebióticos. 

Apesar das características funcionais da casca e do albedo de maracujá, estas ainda não são muito utilizadas, sendo na maioria das vezes descartadas, gerando uma grande quantidade de resíduos, que poderiam ser usados na indústria alimentícia como, por exemplo, na elaboração de bolos por meio de sua farinha, como gelificantes em bebidas lácteas, geleias, uso em chás, entre outros.

Formas de reaproveitamento do albedo de maracujá

Diversos são os estudos sobre o aproveitamento do albedo do maracujá, visto que esse resíduo é descartado com grande frequência pelas indústrias processadoras de polpas.

Entre as formas de aproveitamento, destaca-se a utilização de farinha de albedo de maracujá na substituição parcial da farinha de trigo, para a elaboração de bolos (Oliveira et al., 2019). Neste estudo, as farinhas de albedo foram usadas em proporções de até 25% e foram avaliados os parâmetros de simetria, altura e rendimento, além de dureza, gomosidade e mastigabilidade dos bolos. Os autores constataram que a farinha do albedo de maracujá na proporção de 13% foi ideal para a elaboração do produto, sendo uma ótima alternativa na área de panificação devido seu valor nutricional e baixo custo.

Objetivando desenvolver uma formulação de bebida láctea suplementada com albedo de maracujá e bactéria probiótica (Lacticaseibacillus casei), Martins et al. (2018) avaliaram o efeito prebiótico do albedo na viabilidade do probiótico.  As bebidas lácteas foram preparadas usando L. casei e diferentes quantidades do albedo de maracujá (1, 2 e 3%). Características físico-químicas e microbiológicas dos produtos foram avaliadas após 0, 15 e 30 dias de produção. De acordo com os resultados encontrados ao longo do estudo, a contagem das bactérias láticas presentes nas bebidas lácteas com o albedo de maracujá e L. casei foi maior em relação ao controle, evidenciando a importância da adição do albedo de maracujá.

Geleias de tamarindo com a pectina extraída do albedo de maracujá foram objeto de estudo de Souza, Barbosa e Rodrigues (2016). A geleia preparada com pectina extraída do albedo apresentou boa aceitação sensorial de acordo com os resultados encontrados e a intenção de compra revelou que todos os produtos foram bem aceitos pelos consumidores.

Alguns outros produtos foram elaborados utilizando o albedo de maracujá e os trabalhos estão apresentados no Quadro 1. 

Quadro 1. Diferentes aplicações do albedo de maracujá em produtos alimentícios.

Produto Formulação Principais resultados

Referências

Frozen 

Foi desenvolvido um frozen sem lactose contendo 2% de albedo de maracujá.  O frozen de maracujá sem lactose atendeu a demanda de intolerantes à lactose e conseguiu suprir as necessidades nutricionais. Foi possível utilizar os resíduos do maracujá na elaboração do produto. 

Oliveira et al., 2022

Barra de cereais

Foram elaboradas quatro formulações de barras de cereais, sendo BC01 (sem acréscimo da farinha do albedo do maracujá), BC02 (3% da farinha), BC03 (7% da farinha) e BC04 (11% da farinha).  As barras de cereais atenderam aos padrões de aceitabilidade e quanto aos parâmetros sensoriais foi possível observar que a maioria dos provadores gostaram extremamente e gostaram muito das barras, afirmando que certamente comprariam o produto.

Chaves et al., 2021

Cookies 

Foram desenvolvidas diferentes formulações de biscoitos do tipo cookie sem glúten à base de farinha mista de cascas e albedo de maracujá e arroz com substituição parcial de 5%, 10% e 18,4%. Os resultados obtidos mostram dentre as três formulações desenvolvidas, os cookies contendo 5% e 18,4% de farinha mista de albedo e casca de maracujá obtiveram aceitação por parte dos consumidores.

Souza et al. 2020 

Doces em massa de maracujá, acerola e cajá 

Foram elaboradas três formulações de doce: 1) contendo polpa de maracujá, 2) contendo polpa de acerola e 3) contendo polpa de cajá. Todos contendo 43,5% de albedo de maracujá. O doce de acerola com albedo de maracujá foi o preferido pelos consumidores e 41% dos participantes disseram que certamente comprariam o produto.

Silva et al. (2020)

Massa alimentícia

Foram desenvolvidas três formulações, sendo uma formulação padrão (100% farinha de trigo) e outras duas com 20% e 10% de farinha de albedo de maracujá (FAM). A formulação padrão e a com 10% da FAM tiveram uma homogeneização mais rápida e todas as amostras levaram o mesmo tempo de cocção. Em relação às características sensoriais a formulação com 20% de farinha de albedo de maracujá foi a menos aceita.

Spanholi e Oliveira, 2009

A composição benéfica do albedo do maracujá devido à sua riqueza em fibras dietéticas e ao equilíbrio entre fibras solúveis e insolúveis, destaca-se não apenas por sua capacidade de promover a redução do teor de gordura, mas também por influenciar positivamente problemas tecnológicos, tal como a sinérese, e modificar a textura e viscosidade de produtos de origem animal, como a de embutidos. Além disso, sua importante capacidade de emulsificação e solubilidade torna-o um ingrediente propício para o uso em alimentos funcionais (Moura et al., 2021). Assim, a adição de 2,5% de farinha do albedo de maracujá promoveu modificações positivas nas características físico-químicas e tecnológicas de produtos cárneos. Essas melhorias foram evidenciadas na redução da perda de peso durante o cozimento, na estabilidade de emulsão, na dureza e mastigabilidade, além do aumento do valor nutricional. Assim, destaca-se o papel das fibras, especialmente na capacidade de emulsificação, facilitando a absorção de água e gordura (López-Vargas et al., 2014). 

Considerações finais

A utilização do albedo de maracujá na sua forma natural em alimentos, ou processado, para obtenção de farinha, revela resultados promissores. Com potencial prebiótico, sobretudo devido ao elevado teor de pectina em sua constituição, são inúmeros os seus benefícios à saúde humana e aplicações na indústria alimentícia. Além disso, sua utilização na elaboração de novos produtos contribui para a redução do seu descarte, minimizando o impacto ambiental.

 

Referências 

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