Em 2021 a fome no mundo atingiu 828 milhões de pessoas, um aumento de 46 milhões desde 2020 e 150 milhões desde a pandemia de COVID-19. Quase 3,1 bilhões de pessoas não podiam arcar com os custos de uma dieta saudável em 2020 (FAO et al., 2022). Por outro lado, estima-se que 1/3 das partes comestíveis de alimentos são desperdiçadas ou perdidas, chegando a 1,3 bilhões de toneladas por ano, configurando-se em um paradoxo moral (FAO, 2011). Frutas e hortaliças estão entre os alimentos com maior percentual de perdas dentre os grupos alimentares (FAO, 2019).
Os resíduos e subprodutos de frutas e hortaliças geram impacto ambiental e econômico. Nesse sentido, a economia circular vem se tornando uma tendência global, ao propor que os sistemas lineares de produção mudem de forma a aproveitar os resíduos e subprodutos gerados durante a cadeia produtiva (Brito; Ferreira; Fai, 2020).
A Agenda 2030 é um plano de ação global estabelecido pelas Nações Unidas para promover o desenvolvimento sustentável em suas três dimensões: econômica, social e ambiental. Ela inclui 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que abrangem desde a erradicação da pobreza e a fome, até a promoção da paz e da justiça. Os ODS são interconectados e visam não apenas melhorar a qualidade de vida de todos, mas também proteger o planeta para as gerações futuras. A Agenda 2030 enfatiza a importância da parceria global e da inclusão, assegurando que ninguém seja deixado para trás na busca por um mundo mais justo e sustentável.
Subprodutos e resíduos vegetais incluem cascas, folhas, sementes, farelos, amêndoas, bagaços e outras partes de frutas e hortaliças, que são fontes de antioxidantes, vitaminas, minerais, fibras, ácidos graxos essenciais e substâncias bioativas (Difonzo et al., 2021). Quando explorados de maneira apropriada, esses resíduos transformam-se em ingredientes inovadores para produtos alimentícios, promovendo uma produção e consumo mais responsáveis (ODS 12).
O uso de subprodutos e resíduos vegetais está intimamente ligado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, pois a utilização deles na alimentação ajuda a minimizar o impacto ambiental da produção agrícola, fomenta a economia circular, onde os materiais são continuamente reutilizados, reduzindo a necessidade de novos recursos (ODS 12) e, consequentemente, atua na redução de problemas como a fome e a insegurança alimentar (ODS 2), além de promover a saúde e reduzir a mortalidade (ODS 3). Além disso, essa prática contribui para a mitigação das mudanças climáticas (ODS 13) ao reduzir a emissão de gases de efeito estufa provenientes de resíduos orgânicos em aterros sanitários.
Geralmente, antes de serem usados na fabricação de alimentos, esses subprodutos e resíduos são secos e transformados em farinhas, apresentando não só um papel sustentável como também de saúde. Conforme demonstrado nos estudos a seguir, esses resíduos são extremamente versáteis e saborosos:
- Sementes de Uva e Romã: Aplicadas em bolos, pães e hambúrgueres, tiveram boa aceitabilidade entre consumidores (Panza; Conte; Noble et al., 2022; Levent; Sayaslan; Yeşil, 2021; Bourekoua et al., 2018; Saeidi; Nasehi; Jooyandeh, 2018).
- Bagaço de Caju e Cascas de Goiaba: Utilizados na produção de barras de cereais com altos teores de proteína e fibra alimentar (Muniz et al., 2020).
- Casca e Camadas Internas de Cebola: Promoveu um aumento significativo no conteúdo de compostos fenólicos, flavonoides e capacidade antioxidante em pães sem glúten (Bedrníček et al., 2020).
- Casca de Maracujá: Utilizada na produção de cereal matinal, apresentou um ótimo teor de fibras solúveis e insolúveis (Santos et al., 2019).
- Coco Desengordurado: Aplicado na fabricação de massa (prato típico de países africanos), melhorou a fibra dietética total, teor de proteína, compostos bioativos e propriedades antioxidantes do produto (Adeloye; Osho; Idris, 2020).
- Resíduo de Óleo de Baru: Utilizada na fabricação de biscoitos, melhorou o teor de fibra alimentar total, lipídios, cálcio, ferro e compostos bioativos (Pineli et al., 2015).
- Bagaço de Maçã: Aumentou a atividade antioxidante e o teor de polifenóis e fibras dietéticas, especialmente insolúveis em biscoitos tipo cracker. Os biscoitos também se mostraram ricos em minerais (Mir et al., 2017). Apresentou alto efeito antioxidante em iogurte (Jovanović et al., 2020). Compostos bioativos como quercetina, ácido clorogênico e floridizina melhoraram o conteúdo funcional de pães (Gumul et al., 2021).
- Bagaço de Uvas Vermelha e Branca, Casca de Tomate, Caule e Folhas de Brócolis, Farelo de Milho e Folhas Externas de Alcachofra: Melhoraram o conteúdo nutricional de queijos, aumentando significativamente o conteúdo de compostos fenólicos e flavonoides (Lucera et al., 2018).
- Casca de Cacto: Utilizada em snacks, resultou em menor teor de gordura, alto teor de proteínas e fibras (Miranda et al., 2018).
- Casca de banana: A adição de farinha de casca de banana aumentou o teor de fibra bruta e diminuiu o teor de carboidrato em hambúrgueres (Gomes et al., 2020).
- Resíduo de Milho Doce: Utilizado na fabricação de bolo, aumentou a fibra dietética, carotenoides, vitamina E e folato (Lao et al., 2019).
- Mesocarpo de Babaçu: Em cookies, aumentou o conteúdo de fibras e minerais (Silva et al., 2019) e teve o mesmo efeito em bolos, além de diminuir o conteúdo de glicídios totais (Couri; Giada, 2016).
- Semente de Abóbora: Aumentou o conteúdo de fibras, proteínas, minerais, lipídios e tocoferóis em bolos (Bitencourt et al., 2014) e pães de forma (Costa et al., 2018).
Esses exemplos demonstram o vasto número de resíduos e subprodutos vegetais disponíveis, a diversidade de produtos alimentícios em que podem ser utilizados e seu potencial de expansão para muitos outros.
A reutilização desses materiais não só promove a sustentabilidade e a economia circular, como também contribui para a saúde e nutrição global, alinhando-se aos ODS, criando um impacto positivo e duradouro no meio ambiente e na sociedade.
Em conclusão, a utilização de resíduos e subprodutos vegetais na alimentação é uma estratégia promissora que se alinha perfeitamente com a Agenda 2030 e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Esta prática não só ajuda a minimizar o impacto ambiental da produção agrícola, mas também promove a economia circular, contribui para a redução da fome e da insegurança alimentar, promove a saúde e ajuda a mitigar as mudanças climáticas. Além disso, os resíduos e subprodutos vegetais são fontes ricas de nutrientes e compostos bioativos, oferecendo benefícios significativos para a saúde. A diversidade de resíduos e subprodutos vegetais disponíveis e a variedade de produtos alimentícios em que podem ser utilizados demonstram o enorme potencial desta prática. Portanto, é essencial continuar a explorar e promover o uso de resíduos e subprodutos vegetais na alimentação, a fim de criar um impacto positivo e duradouro no meio ambiente e na sociedade, e contribuir para a realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Referências
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