Como a filosofia Lean nos norteia para cessar a guerra entre produtividade e qualidade

Dia desses ouvi mais uma vez sobre isso e como o atual momento de crise mundial faria com que serviços de alimentação coletiva priorizassem a produtividade.

Primeiramente, gostaria de destacar a diferença entre aumentar a produção e a produtividade. O aumento da produção é produzir, pura e simplesmente, mais com mais recursos; enquanto aumentar a produtividade é produzir o mesmo com menos recursos e menos tempo, mantendo a qualidade do produto.

No anseio de saírem da crise é comum aos serviços pensarem no aumento da produção, e alguns efetivamente a escolhem em detrimento da qualidade do produto, mas isso seria, como dizem, um tiro no pé! Principalmente no momento onde os consumidores se tornaram ainda mais atentos ao que consomem no que tange à qualidade.

Assumir que o aumento da produtividade é essencial para sobrevivência do negócio, é tomar para si que a chave está na eliminação de desperdícios. E é aí que a filosofia Lean entra, pois ela tem como objetivo a maximização da agregação de valor para o cliente com base na redução de desperdícios.

Para situar sobre o que falo, o Lean nasceu no Japão pós-guerra na fábrica da Toyota, e por lá ele é conhecido como Sistema Toyota de Produção ou TPS. O Japão nunca foi um país rico em recursos e no pós-guerra se viu ainda mais limitado. Sua única solução era fazer mais com menos. A filosofia foi sendo criada e a Toyota passou a ser foco de atenção de outras montadoras, pois mesmo faturando menos seu lucro superava o dos seus concorrentes.

A filosofia Lean nos apresenta inúmeras ferramentas, mas vai além, nos ensinando uma mentalidade enxuta, onde o foco é no aumento da produtividade, com qualidade, com menor custo, um lead-time mais curto, melhorando o desempenho operacional e a mudança do comportamento humano.

Qual seria então a relação entre qualidade e produtividade com a filosofia Lean e como trabalhamos para que elas andem juntas?

O Lean possui 5 princípios conectados entre si, e partimos sempre do princípio de entregar mais VALOR para o cliente. Como mencionei, o cliente é o centro de toda filosofia. E tudo que fazemos na produção é com o foco de atender todas as necessidades de quem compra, envolvendo vários fatores, inclusive a qualidade.

A partir desse primeiro princípio nossa meta é fornecer a mais alta qualidade com o menor custo, dentro do menor tempo, através da contínua eliminação de muda1 – que significa qualquer atividade que o cliente não esteja disposto a pagar por ela. Tal atividade deve transformar o produto ou serviço de algum modo e ser feita da forma correta na primeira vez.

No segundo princípio, o FLUXO DE VALOR, está implícito retirar do fluxo produtivo o que não agrega valor, ou seja, desperdícios. Devemos alinhar na melhor sequência as atividades que criam valor. Através de uma ferramenta chamada Mapeamendo do Fluxo de valor teremos uma representação completa e baseada em fatos, do fluxo de atividades no momento atual – do início ao fim – necessário para entregar um produto ou serviço para o cliente e o quanto é gasto enquanto não se tem valor agregado.

Esse mapa do fluxo de valor contém infomações importantes como passos do processo, estoques, fluxo de informação, quadro de pontos, tempo de entrega e tempo takt – que demonstra a taxa de demanda do cliente.

O terceiro princípio, por conseguinte, trata do FLUXO CONTÍNUO. A partir do fluxo mapeado e todos os desperdícios identificados criamos o mapa do fluxo de estado futuro, passamos a trabalhar para que o fluxo não sofra interrupções e para que não se cruze. Identificamos e corrigimos pontos que possam gerar falhas no produto como, por exemplo, contaminação cruzada.

Pode parecer um esforço enorme, mas na realidade o mapeamento do fluxo de valor é executado em uma curta expectativa de tempo e a partir dele conseguimos identificar métricas para o melhoramento, priorizamos mudanças mais significativas para o cliente, criamos um projeto com dimensão para que seja significativo e mensurável e a partir daí vamos mudando uma coisa por vez.

O quarto princípio é o SISTEMA PUXADO. O processo é pensado e repensado através da solicitação pelo cliente. No Lean sempre trabalhamos com estoques reduzidos e otimizados, com o suficiente em quantidade e qualidade para atender à demanda do cliente. O estoque reduzido facilita o controle de qualidade.

Com esse princípio em mente e com todas as ferramentas que ele traz, passamos a produzir no tempo takt, que como fora mencionado anteriormente, se trata do tempo que preciso produzir para atender a demanda do cliente. Num modelo ultrapassado de produção de refeições, as equipes produzem todo o volume de refeições planejadas para o dia. No modelo Lean, produzimos em lotes, analisando a demanda, é o cliente que puxa o pedido.

Nesse novo modelo de operação produzimos o essencial e se, já estávamos reduzindo custos desde a implementação do pensamento enxuto, a partir desse momento elevamos o serviço a outro patamar. Cozinhas muito mais produtivas, eficientes e eficazes.

O último e não menos importante princípio trata da PERFEIÇÃO, trabalhamos sempre em busca da perfeição dos processos, dos produtos e das pessoas envolvidas, sempre com o foco na melhor entrega para o cliente.

Nosso trabalho é de melhoramento contínuo, o kaizen como os japoneses chamam, se trata de uma filosofia de melhoramento que encoraja mudanças incrementais e contínuas, mais que um evento ou workshop como muitos conhecem, o verdadeiro kaizen é um estilo de vida, com ele focamos na humanização do local de trabalho e na eliminação do trabalho pesado, usando a inteligência.

Essa busca pela melhoria dos processos e a preocupação com a qualidade fazem parte da filosofia Lean e servem como base para que os serviços de alimentação coletiva atendam os requisitos de Boas Práticas, como também os requisitos de certificações de qualidade cabíveis. Além de agir diretamente no aumento da produtividade e redução dos custos da produção, aumentando lucro, fazendo com que se destaquem dos concorrentes, deixando clientes mais satisfeitos e, por consequência, fiéis a marca.

Referências:

Produção Lean simplificada. Um guia para entender o sistema de produção mais poderoso do mundo. Dennis Pascal. Ed. Bookman, Segunda edição.

O Sistema Toyta de Produção. Além da produção em larga escala. Taiichi Ohno. Ed. Bookman.

Gemba Kaizen. Uma abortdagem de bom senso à estratégia de melhoria contínua. Masaaki Imai. Ed. Bookman.

Consejos Lean para los restaurantes. Lean Institute Colômbia. <https://institutolean.co/consejos-lean-para-los-restaurantes/> Acesso em 14/07/2020.

Repensando os restaurantes após a Covid-19. Lean Institute Brasil. <https://www.lean.org.br/artigos/678/repensando-os-restaurantes-apos-a-covid-19.aspx> Acesso em 14/07/2020.

1 – Muda, Mura, Muri – Tipos Atividades que Geram Desperdícios. Três termos normalmente utilizados em conjunto no Sistema Toyota de Produção (conhecidos como “os três Ms”) que descrevem coletivamente práticas que geram desperdício a ser eliminado.

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