A indústria brasileira de alimentos e bebidas tem grande representatividade no cenário nacional e global. De acordo com o relatório anual de 2024 da ABIA (Associação Brasileira da Indústria de Alimentos), a indústria nacional processa 60,9% de todos os insumos gerados pelo campo (carnes, café e açúcar, por exemplo), gera 1,97 milhões de empregos formais e diretos com o envolvimento de 41 mil empresas, representa 10,8% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional e é considerada, a maior exportadora mundial em volume de alimentos industrializados com 72 milhões de toneladas para 190 países (ABIA, 2024).
A agropecuária é destaque desta indústria, sob aspectos positivos e negativos. Compondo em torno de 21% do PIB nacional (CEPEA, 2024), se destaca positivamente por possuir seus principais insumos porém, analisando em relação ao conceito de sustentabilidade, se destaca negativamente por emitir cerca de 38% dos Gases de Efeito Estufa (GEEs) do país e 75% de toda a sua emissão de gás metano (CH4) (SEEG, 2024), gás este que tem em média 80 vezes maior potencial de retenção de calor que o gás carbônico (CO2) (NATURE, 2021). Estes índices trazidos pelo setor da agropecuária, impulsionam o Brasil a estar entre os dez países no ranking dos que emitem cerca de 60% dos GEEs globais (CLIMATE WATCH HISTORICAL GHG EMISSIONS, 2022).
O acrônimo ESG (Environment, Social e Governance), assunto do qual trata o documento normativo ABNT PR 2030-1, é um termo que precede o conceito de sustentabilidade e foi criado em 2004 pelo Pacto Global da ONU (Organização das Nações Unidas) em parceria com o Banco Mundial através do relatório “Who Cares Win” (Quem se Importa Ganha), objetivando uma provocação às instituições financeiras para que integrassem os fatores sociais, ambientais e de governança ao mercado de capitais (PACTO GLOBAL REDE BRASIL, 2024).
O documento normativo ABNT PR 2030-1:2024 – Ambiental, Social e Governança (ESG) parte 1 – Conceitos, diretrizes e modelo de avaliação e direcionamento para organizações – orienta as empresas e instituições, independente do seu porte, setor ou constituição, a incorporar, mensurar, avaliar e aplicar os conceitos e princípios ESG ao seu negócio, identificando o estágio de evolução em relação aos critérios ESG considerados relevantes para a organização. O documento contribui para o desenvolvimento sustentável nos níveis local, regional e global. O documento normativo está dividido em três eixos – Ambiental, Social, Governança, cada qual subdividido em temas e estes, subdivididos em critérios. No eixo ambiental, o tema Mudanças Climáticas tem como um dos critérios a Mitigação de emissões de gases de efeito estufa (GEE).
De acordo com a ABNT PR 2030-1:2024, para que as emissões antrópicas sejam mitigadas, ou seja gerenciar as emissões causadas pelo agente humano, é necessário serem “medidas, monitoradas, os riscos geridos e dimensionados, as oportunidades detectadas e deve ser conferida maior transparência para as partes interessadas”. Os relatórios ESG, de sustentabilidade ou integrado são ferramentas reconhecidas pelo documento normativo para conceder uma maior participação dos stakeholders e, consequentemente, agregar valor a seus negócios proporcionalmente aos resultados divulgados.
O Anuário Integridade ESG de 2024, alimentado pelos relatórios de sustentabilidade das empresas dos principais setores econômicos do país, elenca os pilares quanto às políticas ESG. No setor alimentar, o eixo ambiental é salientado por assuntos envolvendo a mitigação dos GEEs com “Preservação Ambiental” e “Efeitos Climáticos”. Como ações efetivas ao critério deste estudo, destaca-se a agricultura regenerativa e suas conexões de transformação conforme Figura 1.
Figura 1 – Práticas previstas na agricultura regenerativa
Fonte: (CEBDS, 2023)
A agricultura regenerativa, por definição da literatura segundo citado no CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável) , visa um sistema produtivo sustentável que gere impacto socioambiental reduzido e até positivo, promovendo a redução de GEE e a conservação dos agroecossistemas. Em território nacional, tem o objetivo entre outros de conservar e reabilitar sistemas alimentares e agrícolas, gerar emissões de GEE nulas ou negativas, melhoria do ciclo hidrológico e aumento da biodiversidade (CEBDS, 2023).
Por fim, a ABNT PR 2030-1:2024 associa os critérios relacionados em seu documento aos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis) a fim de gerir e dimensionar todos os riscos inerentes. Assim, o critério mitigação de emissões de GEE tem os ODS relacionados 13 (combate às alterações climáticas) como principal e 9, 12, 14 e 15 como adicionais, conforme Figura 2.
Figura 2 – Critério Mitigação de emissões de gases de efeito estufa e ODS relacionados
Fonte: Adaptada da ABNT PR 2030-1:2024
Sendo o ODS 13 o principal vinculado ao critério deste estudo, sua meta 13.2 é responsável por “integrar medidas da mudança do clima nas políticas, estratégias e planos nacionais” e seu indicador 13.2.2 “Emissões totais de gases de efeito estufa por ano”, visa ser instrumento a possibilitar a estabilização das concentrações de GEE na atmosfera, em níveis preventivos às consequências catastróficas do sistema climático, como objetivo final da UNFCCC (Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança no Clima) (ODS, 2024). Porém, a agropecuária brasileira registrando o quarto aumento sucessivo em emissões de GEE (SEEG, 2024), não corrobora junto a esse objetivo e as consequências catastróficas são cada vez mais concretas a exemplo da enchente histórica no Rio Grande do Sul em maio de 2024, o que reflete o desequilíbrio da representatividade do setor para este fim.
REFERÊNCIAS
ABIA (Associação Brasileira da Indústria de Alimentos). Relatório anual 2024. Disponível em: https://www.abia.org.br/vsn/temp/RelatorioAnual2024_digital.pdf. Acesso em 6 de abril 2024.
CEPEA (Centro de Estudos Avançados de Economia Aplicada). PIB do agronegócio Brasileiro, 2024. Disponível em: https://www.cepea.esalq.usp.br/br/pib-do-agronegocio-brasileiro.aspx. Acessado em 3 de dez 2024
Nature. Control Methane to slow global warming fast, 2021 DOI: https://doi.org/10.1038/d41586-021-02287-y. Acessado em 22 de ago 2024
Climate Watch. Climate Watch Historical GHG Emissions, 2021. Washington, DC: Instituto de Recursos Mundiais. Disponível em: https://www.climatewatchdata.org/ghg-emissions?end_year=2021&start_year=1990. Acessado em 23 de out 2024
- Pacto Global Rede Brasil. Disponível em: https://www.pactoglobal.org.br/sobre-nos/ Acesso em 5 de dez 2024.
ABNT. ABNT PR 2030-1. Disponível em: https://www.abntcatalogo.com.br/. Acessado em 02 de dez 2024
- Anuário Integridade ESG, 2024. Disponível em: https://integridadeesg.insightnet.com.br/anuario-integridade-ESG-2024.pdf. Acessado em 24 de out 2024
- CEBDS. Agricultura regenerativa no Brasil: desafios e oportuidades. Disponível em: https://cebds.org/publicacoes/agricultura-regenerativa-no-brasil-desafios-e-oportunidades/. Acessado em 24 de out 2024
- SEEG (Sistema de Estimativa de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa). Análise das Emissões de Gases de Efeito Estufa e suas implicações para as metas climáticas do Brasil, 2024. Disponível em: https://seeg.eco.br/. Acessado em 3 de dez 2024
- ODS, 2024 Indicadores Brasileiros para os objetivos de desenvolvimento sustentável. Disponível em: https://odsbrasil.gov.br/objetivo13/indicador1322. Acessado em 24 de out 2024