Subprodutos agroindustriais na alimentação de ruminantes

Sustentabilidade e reflexos na produção de alimentos de origem animal

A alimentação animal é um dos pilares fundamentais da produção pecuária, especialmente quando se trata de ruminantes, como bovinos, ovinos e caprinos. No entanto, a forma como esses animais são alimentados têm um impacto significativo no meio ambiente. Tradicionalmente, a nutrição de ruminantes depende em grande parte de pastagens e de grãos, como milho e soja, cuja produção está associada a uma série de problemas ambientais, incluindo o desmatamento, o uso excessivo de água e a emissão de gases de efeito estufa (GEE).

Essa prática não só contribui para a redução da pegada de carbono e o uso mais eficiente dos recursos naturais, mas também fortalece a sustentabilidade do setor, promovendo a reutilização de resíduos e diminuindo a pressão sobre áreas agrícolas dedicadas à produção de grãos convencionais. Dessa forma, ela oferece uma solução equilibrada, que beneficia tanto o meio ambiente quanto a competitividade do setor agropecuário.

Os subprodutos agroindustriais são resíduos gerados durante o processamento de produtos agrícolas, como frutas, grãos, cana- de-açúcar e oleaginosas. Muitas vezes descartados ou subutilizados, esses materiais podem ser transformados em ingredientes valiosos para a alimentação animal, aproveitando sua riqueza nutricional. Exemplos comuns incluem o bagaço de cana, cascas de frutas, tortas de oleaginosas (resíduos da extração de óleos) e farelos de cereais. Esses subprodutos oferecem uma alternativa econômica e sustentável à utilização de grãos convencionais, ajudando a reduzir o desperdício e a promover a eficiência na cadeia produtiva (Figura 1).

 

FIGURA 1 – Subprodutos do processamento agroindustrial como fonte de novos ingredientes alimentares. Fonte: FERREIRA et al., (2015).

A incorporação desses subprodutos na dieta de ruminantes não apenas reduz o desperdício, mas também diminui a pressão sobre os recursos naturais, como solo e água, que seriam necessários para a produção de alimentos convencionais.  Um dos principais benefícios ambientais da utilização de subprodutos agroindustriais na nutrição de ruminantes é a significativa redução da pegada de carbono da pecuária. Isso ocorre porque a produção de grãos como milho e soja, essenciais na alimentação animal, está intimamente associada a altas emissões de gases de efeito estufa (GEE), tanto devido ao uso intensivo de fertilizantes nitrogenados quanto pelo desmatamento necessário para expandir as áreas de cultivo. Ao substituir ou complementar esses grãos com subprodutos agroindustriais, é possível reduzir as emissões e contribuir para uma pecuária mais sustentável e menos impactante para o meio ambiente.

Ao substituir parte desses grãos por subprodutos, é possível diminuir a demanda por novas áreas agrícolas, reduzindo assim o desmatamento e as emissões associadas. Além disso, muitos subprodutos têm um ciclo de vida mais curto e exigem menos energia para serem processados, o que contribui para uma menor emissão de GEE em comparação com os grãos tradicionais.

Outro impacto positivo do uso de subprodutos agroindustriais está relacionado à gestão de resíduos. Atualmente, grandes quantidades de resíduos agroindustriais são descartados em aterros ou queimados, o que pode ocasionar a poluição do solo, da água e do ar. Ao transformar esses resíduos em alimentos para ruminantes, é possível reduzir significativamente a quantidade de lixo gerado e promover uma economia circular, onde os materiais são reaproveitados em vez de descartados. Por exemplo, o bagaço de cana, um resíduo da produção de açúcar e etanol, pode ser utilizado como fonte de fibra na dieta de bovinos, reduzindo a necessidade de pastagens e contribuindo para a sustentabilidade do setor sucroalcooleiro.

A utilização de subprodutos agroindustriais também pode contribuir para a conservação dos recursos hídricos. A produção de grãos convencionais, como milho e soja, requer grandes quantidades de água, tanto para irrigação quanto para o processamento. Em contraste, muitos subprodutos são gerados a partir de culturas que já foram colhidas e processadas, o que significa que a água utilizada em sua produção original é reaproveitada. Isso reduz a pressão sobre os recursos hídricos, especialmente em regiões onde a água é escassa. Além disso, a incorporação de subprodutos na dieta de ruminantes pode melhorar a eficiência no uso da água, uma vez que a produção desses materiais geralmente demanda menos recursos hídricos em comparação com o cultivo de grãos tradicionais. O menor custo ambiental refere-se, nesse contexto, à redução no consumo de água, menor necessidade de insumos agrícolas (como fertilizantes e pesticidas) e à valorização de resíduos que, de outra forma, poderiam ser descartados.

No entanto, a utilização de subprodutos agroindustriais na nutrição de ruminantes não está isenta de desafios. Um dos principais obstáculos é a variabilidade na composição nutricional desses materiais. Diferentes subprodutos podem ter níveis variáveis de proteína, fibra e energia, o que exige um manejo cuidadoso para garantir que as necessidades nutricionais dos animais sejam atendidas. Além disso, alguns subprodutos podem conter substâncias antinutricionais ou contaminantes, como micotoxinas, que podem prejudicar a saúde dos animais. Para superar esses desafios, é essencial investir em pesquisas e tecnologias que permitam a caracterização e o processamento adequado desses materiais, garantindo sua segurança e eficácia como ingredientes na alimentação animal.

Outro desafio é a logística de coleta, transporte e armazenamento dos subprodutos. Muitas vezes, esses materiais são gerados em locais distantes das fazendas de criação de ruminantes, o que pode aumentar os custos e a pegada de carbono associada ao transporte. Para tornar o uso de subprodutos mais viável, é necessário desenvolver cadeias de suprimento eficientes e investir em infraestrutura para o armazenamento e a conservação desses materiais. Além disso, a adoção de práticas como a secagem e a compactação, pode facilitar o transporte e o armazenamento, reduzindo os custos e os impactos ambientais.

Apesar dos desafios, a utilização de subprodutos agroindustriais na nutrição de ruminantes representa uma oportunidade significativa para promover a sustentabilidade da pecuária. Além dos benefícios ambientais, essa prática também pode trazer vantagens econômicas para os produtores, já que muitos subprodutos têm um custo menor em comparação com os grãos tradicionais. Além disso, a valorização desses resíduos pode gerar novas fontes de renda para as indústrias agroalimentares, contribuindo para o desenvolvimento econômico das regiões produtoras.

A utilização de subprodutos agroindustriais na alimentação de ruminantes surge como uma estratégia promissora para reduzir os impactos ambientais da pecuária. Ao substituir parte dos grãos convencionais, como milho e soja, por resíduos agroindustriais, é possível diminuir significativamente a pegada de carbono, reduzir a pressão sobre os recursos naturais e conservar os recursos hídricos. Essa abordagem contribui para uma gestão mais eficiente dos resíduos gerados pelas agroindústrias, promovendo a sustentabilidade no setor e oferecendo uma alternativa mais econômica e ecológica para a alimentação animal.

No entanto, para que essa prática seja amplamente adotada, é necessário superar desafios relacionados à variabilidade nutricional, à logística e ao processamento dos subprodutos. Com investimentos em pesquisa, tecnologia e infraestrutura, a nutrição de ruminantes com subprodutos agroindustriais pode se tornar uma peça-chave na transição para uma pecuária mais sustentável e resiliente.

A adoção de subprodutos agroindustriais na alimentação de ruminantes tem o potencial de promover uma verdadeira transformação na produção agropecuária, integrando a sustentabilidade às práticas tradicionais da pecuária. Essa mudança não se limita aos benefícios ambientais, mas também pode gerar um impacto positivo na eficiência econômica do setor, uma vez que a utilização desses resíduos pode reduzir custos com insumos alimentares. Ao valorizar subprodutos que, de outra forma, seriam descartados ou pouco aproveitados, abre-se a possibilidade de criar uma cadeia produtiva mais circular, onde os resíduos são reutilizados de maneira inteligente, contribuindo para a redução de desperdícios e incentivando práticas mais responsáveis na gestão de recursos. A longo prazo, essa transformação pode gerar uma maior estabilidade para os produtores, ao mesmo tempo em que responde de forma positiva às pressões ambientais e sociais por uma produção mais limpa e eficiente.

É importante destacar que a valorização dos subprodutos agroindustriais pode incentivar o desenvolvimento de novos mercados e cadeias produtivas, com benefícios tanto para os produtores rurais quanto para as indústrias agroalimentares. Ao integrar esses materiais como ingredientes na alimentação animal, surge uma nova oportunidade de negócio, o que pode, por sua vez, gerar mais empregos e impulsionar a economia local. Com uma abordagem holística e coordenada, envolvendo todos os elos da cadeia produtiva, é possível não apenas melhorar a produtividade do setor agropecuário, mas também alcançar uma produção de alimentos mais equilibrada, respeitando os limites do meio ambiente e as necessidades de uma população crescente.

Portanto, a utilização de subprodutos agroindustriais na alimentação de ruminantes representa uma oportunidade de inovação, tanto no aspecto ambiental quanto econômico, alinhando-se com as tendências de sustentabilidade e responsabilidade social que moldam o futuro da agricultura e pecuária no mundo.

Agradecimentos

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) (Processo n. 303505/2023-0), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG), Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) e IF Goiano – Campus Rio Verde pelo apoio à realização da pesquisa.

Referências Bibliográficas

● BIZZUTI, Beatriz Elisa. Sustentabilidade da produção: uso de subprodutos agroindustriais na produção de pequenos ruminantes. 2019. Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.

● FERREIRA, SÓNIA & FERNANDES, PEDRO A. R. & CARDOSO, SUSANA & WESSEL, DULCINEIA. (2015). Subprodutos Agroindustriais. Boletim da Sociedade Portuguesa de Biotecnologia. 2. 9-11.

● GUEDES, J. D. A. C. (2021). Produção científica do Programa de Pós- graduação em Ciência Animal da Universidade Federal de Campina Grande na área de coprodutos e subprodutos agroindustriais.

● LUCAS, Bruna Nichelle; SCHU, Andressa Inês; DALLA NORA, Flávia Michelon. Benefícios dos compostos bioativos encontrados em resíduos agroindustriais utilizados na alimentação animal. Compostos Bioativos e suas Aplicações, p. 208, 2021.

● MELO, Henrique Teixeira. Uso de subprodutos na nutrição animal. 2021.

● MENEZES, Ari Santana. A IMPORTÂNCIA DOS RESÍDUOS E SUBPRODUTOS NA ALIMENTAÇÃO DE ANIMAIS RUMINANTES: UTILIZAÇÃO DE SUBPRODUTOS DO BARU NA ALIMENTAÇÃO DE OVINOS NO NORDESTE GOIANO. Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo, v. 9, n. 1, p. 231-240, 2024.

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