Você provavelmente deve ter ouvido falar nos últimos dias sobre o caso de gripe aviária no Brasil. A informação foi confirmada pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) na quinta-feira (15/05), com a detecção do vírus da influenza aviária de alta patogenicidade (IAAP) em matrizeiro de aves comerciais no estado do Rio Grande do Sul, no município de Montenegro.
Este foi o primeiro foco de IAAP detectado em sistema de avicultura comercial no Brasil. Segundo o órgão regulador, desde 2006 ocorre a circulação do vírus, principalmente na Ásia, África e no norte da Europa.
Autoridades alertam para o fato da doença não ser transmitida pelo consumo de carne de aves nem de ovos. “A população brasileira e mundial pode se manter tranquila em relação à segurança dos produtos inspecionados, não havendo qualquer restrição ao seu consumo. O risco de infecções em humanos pelo vírus da gripe aviária é baixo e, em sua maioria, ocorre entre tratadores ou profissionais com contato intenso com aves infectadas (vivas ou mortas)”, explica o Mapa em comunicado.
Por isso, mais do que nunca, o conhecimento técnico e ações rápidas podem ser aliados estratégicos para a indústria de alimentos. Anteriormente, em entrevista ao Portal e-food, o médico veterinário e pesquisador da Embrapa Suínos e Aves, Luizinho Caron esclareceu algumas dúvidas quando foi decretado estado de emergência zoossanitária no Brasil causada após a detecção da infecção pelo vírus em aves silvestres.
Na ocasião, o especialista já destacava que o risco de transmissão da gripe aviária em humanos é maior entre aqueles que têm contato próximo com os animais. Já a transmissão do vírus entre humanos é um risco remoto, não tendo, até o momento, nenhum caso comprovado.
Riscos para o Brasil é muito mais comercial
Apesar da preocupação com os recentes casos de Influenza Aviária no Brasil, o principal risco enfrentado pelo Brasil é comercial, e não ligado à segurança de alimentos.
O Brasil é o maior exportador mundial de carne de frango e tem na avicultura uma das bases da sua economia agroindustrial. Mais de 35,3% de toda a carne de frango produzida no Brasil é destinada ao mercado externo. Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul concentram 78% das exportações.
Logo, casos confirmados da doença, mesmo quando restritos a aves silvestres, acabam levando à suspensão temporária de exportações, conforme protocolos internacionais de sanidade animal. Este foi o caso da China, União Europeia (UE) e da Argentina, que suspenderam na sexta-feira (16/05) as importações da carne de frango brasileira, inicialmente por 60 dias. Isso gera impactos diretos na economia, nos empregos e na confiança dos parceiros comerciais.
Do ponto de vista da saúde pública, a transmissão da gripe aviária para humanos é rara e ocorre, principalmente, por contato direto com aves infectadas. Além disso, não há evidências de que o consumo de carne de frango ou ovos devidamente inspecionados ofereça risco à população.
Requisitos de rastreabilidade entram em prática
De acordo com a Food and Agriculture Organization (FAO), a rastreabilidade é a capacidade de acompanhar o caminho de um alimento ao longo de etapas específicas da produção, do processamento e da distribuição. Esse requisito, tão discutido na indústria de alimentos, nunca foi tão essencial quanto em situações como essa.
Segundo o Mapa, os ovos para incubação fornecidos pela granja onde foi registrado o caso de influenza aviária de alta patogenicidade (IAAP) já foram rastreados e enviados para incubatórios localizados em Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul.
Também foi determinado a adoção imediata das medidas de saneamento previstas no plano de contingência para influenza aviária e doença de Newcastle, o que inclui a destruição dos ovos, com o objetivo de mitigar qualquer risco sanitário. “De toda forma, ressaltamos que não há comprovação de que tais ovos estejam contaminados com vírus da gripe aviária e que todas as medidas necessárias para proteção da avicultura nacional estão sendo adotadas, reforçando o compromisso do Mapa com a sociedade e com o setor produtivo”, esclareceu o órgão.
Em artigo publicado no Portal e-food, a engenheira química Luisa Cimatti explica que a eficácia do sistema de rastreabilidade é colocada à prova quando as indústrias de alimentos se deparam com situações reais de desvios em seus produtos, que possam resultar em uma ação de recolhimento ou recall. “Nesse momento, a análise do histórico do lote do produto é fundamental para a identificação das causas do problema, além de direcionar as medidas de retenção dos produtos afetados, onde eles estiverem”, observa a autora.
Voltando a atenção para o caso recente de gripe aviária no Brasil, equipes envolvidas na vigilância e na resposta à gripe animal devem ser treinadas para implementar esses planos em caso de emergência, além de receber recursos necessários para isso.
Também é fundamental que produtores de aves reforcem a biossegurança em suas instalações, evitando o contato entre aves domésticas e aves selvagens, inclusive por meio de água e ração. A OMS, por sua vez, destaca que os produtores desempenham papel fundamental na detecção precoce da doença e precisam ser capazes de reconhecê-la e notificá-la às autoridades veterinárias, para que a gripe aviária possa ser descartada ou confirmada e medidas apropriadas sejam tomadas.
O Mapa reforça que ao longo desses anos, para prevenir a entrada dessa doença no sistema de avicultura comercial brasileiro, várias ações vêm sendo adotadas, como o monitoramento de aves silvestres, a vigilância epidemiológica na avicultura comercial e de subsistência, o treinamento constante de técnicos dos serviços veterinários oficiais e privados, ações de educação sanitária e a implementação de atividades de vigilância nos pontos de entrada de animais e seus produtos no Brasil.
“Tais medidas foram cruciais e se mostraram efetivas e eficientes para postergar a entrada da enfermidade na avicultura comercial brasileira ao longo desses quase 20 anos”, diz o órgão.
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Dúvidas frequentes sobre a gripe aviária
O que é a influenza aviária?
A influenza aviária, comumente conhecida como gripe aviária, é uma doença causada por vírus influenza originários de aves. Esses vírus pertencem à família Orthomyxoviridae e incluem o A(H5N1). Eles afetam principalmente aves, mas também foram detectados em mamíferos, incluindo bovinos. A gripe aviária raramente afeta humanos, mas a orientação é que as pessoas se mantenham informadas e tomem as medidas preventivas recomendadas.
Como acontece a transmissão?
A forma mais comum de entrada do vírus em um território é por meio de aves selvagens migratórias. O principal fator de risco para a transmissão do vírus de aves para humanos é o contato direto ou indireto com animais infectados ou com ambientes e superfícies contaminadas por fezes ou outros fluidos animais. Depenar, manusear carcaças de aves infectadas e preparar aves para consumo, especialmente em ambientes domésticos, também podem ser fatores de risco.
Quais são os sintomas em humanos?
Os sintomas variam de leves – com alguns pacientes até mesmo assintomáticos – a graves. As principais manifestações relatadas incluem febre, tosse, resfriado, conjuntivite, sintomas gastrointestinais e problemas respiratórios.
Qual é o tratamento para a gripe aviária?
Medicamentos antivirais são recomendados para pessoas com quadros graves ou em risco de desenvolver quadros graves devido a condições pré-existentes ou subjacentes, como no caso de idosos ou indivíduos com problemas de saúde crônicos. A orientação é que pessoas que apresentarem sintomas de gripe aviária entrem em contato com um profissional de saúde para receber o tratamento adequado.
Pessoas podem morrer de gripe aviária?
Os seres humanos não têm imunidade prévia à gripe aviária, portanto, o vírus pode causar quadros graves da doença. Entretanto, a OMS diz ser difícil generalizar a análise com base em dados históricos, já que o vírus tem evoluído. Desde 2003, cerca de 900 casos humanos de infecção por A(H5N1) foram relatados, com uma taxa de mortalidade superior a 50%.
Existe uma vacina para gripe aviária?
A OMS atualiza regularmente vacinas em potencial no intuito de se preparar para eventuais pandemias, o que ajuda a garantir que as doses possam ser produzidas rapidamente, se necessário. No caso do vírus H5N1 encontrado em vacas leiteiras, a entidade já tem vacinas em potencial prontas por meio de seu Sistema Global de Vigilância e Resposta à Influenza. Em relação a vacinas para humanos, a OMS tem acordos com 15 fabricantes de imunizantes para acessar cerca de 10% da produção em tempo real de uma futura dose contra a influenza em caso de pandemia. Essas vacinas, segundo a entidade, serão distribuídas aos países com base no risco e na necessidade para a saúde pública.
A vacina contra a gripe sazonal protege contra a gripe aviária?
As vacinas atuais contra a influenza sazonal ou gripe comum não protegem contra a infecção humana pelo vírus da gripe animal, incluindo os vírus H5N1.
Quem corre risco de contrair a gripe aviária?
De acordo com a Opas, sempre que houver qualquer tipo de exposição a animais infectados (como aves domésticas, aves selvagens ou mamíferos) ou a ambientes contaminados, onde circulam os vírus da gripe aviária, existe risco de infecção humana esporádica. Casos humanos de gripe aviária associada ao vírus A(H5N1), segundo a entidade, são isolados. Ao longo dos últimos anos, cerca de 70 infecções humanas foram relatadas na região das Américas, sendo 67 nos Estados Unidos (até abril de 2022), uma no Equador (janeiro de 2023), uma no Chile (março de 2023) e uma no Canadá (novembro de 2024), com uma morte associada à infecção nos Estados Unidos. A maioria dos casos está ligada ao contato com a criação de gado (40 casos, todos nos Estados Unidos) ou aves. A transmissão entre humanos não foi identificada em nenhum desses cenários.
É seguro consumir ovos e frango originários de áreas com surto em animais?
Carnes e ovos podem ser consumidos com segurança, desde que preparados adequadamente. O consumo de carne e ovos crus ou mal cozidos de áreas com surtos de gripe aviária é de alto risco e deve ser evitado. Da mesma forma, animais doentes ou que morreram inesperadamente não devem ser consumidos.
Como preparar carne e ovos com segurança?
A OMS recomenda seguir cinco orientações específicas:
- Mantenha o ambiente limpo;
- Separe alimentos crus dos cozidos;
- Longo tempo de cozimento;
- Manter alimentos em temperaturas seguras;
- Utilizar água e matérias-primas seguras.
É seguro comer queijo e outros laticínios?
Laticínios feitos com leite pasteurizado e que seguem rigorosos padrões de higiene são considerados seguros para consumo. No caso do queijo de leite cru, a sobrevivência do vírus durante a produção está sendo investigada. Como precaução, a produção de queijo de leite cru em áreas com surtos não é recomendada.
A carne bovina foi afetada? É seguro consumir carne de animais afetados?
Não foram relatados casos de detecção em rebanhos de gado de corte. A OMS recomenda o cozimento completo da carne para reduzir a exposição a patógenos.
Fontes: