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Fraude em alimentos (food fraud) além dos requisitos das certificações reconhecidas pelo GFSI

No complexo mundo da fraude em alimentos (food fraud), as ações necessárias para sua mitigação real dependem de diversos fatores. Os requisitos incorporados nas certificações reconhecidas pelo GFSI são uma pequena ponta do ‘iceberg’.

O intuito desse ‘post’ é complementar com informações relevantes outros textos sobre a fraude em alimentos (food fraud) mostrando o quão complexo é o problema e as ações para a sua mitigação.

Iniciamos ressaltando que o grande problema é a impossibilidade dos consumidores detectarem fraudes sozinhos!

Outro problema é que o sistema de prevenção às fraudes exigido pelas normas reconhecidas pelo GFSI (‘Global Food Safety Initiative’) para a indústria de alimentos é uma pequena gota no meio do oceano. Não estamos afirmando que esses não contribuam e não sejam importantes para o processo de combate aos fraudadores. Fazendo uma comparação simples, é claro que segue sendo importante economizarmos água em nossas casas, mesmo sabendo que existem ações mais impactantes no combate à falta de água potável em um âmbito mundial. 

Mas, não é o objetivo falarmos sobre a contribuição dos requisitos normativos no cenário mundial de combate a fraudes e sim de ações mais amplas.

Antes de seguirmos adiante é importante contextualizar alguns pontos relevantes.

1) Aumento de casos de fraudes e suas complexidades:

É fato e não é segredo para ninguém que a quantidade de fraudes vem aumentando a nível mundial em vários países ao mesmo tempo e que vários fatores contribuem para isso. Sem a intenção de listar todos os fatores que ocasionam esse crescimento, destacamos alguns muito atuais como:

– a alta complexidade da internacionalização da cadeia produtiva de alimentos, ou seja, produtos finais compostos por ingredientes oriundos de diversos fornecedores ou que são intermediados por diversos prestadores de serviços ao redor do mundo (Ex.: importadores, armazenadores, comercializadores e etc.);

– a alta demanda por alimentos ‘premium’ ou exóticos, ou seja, que possuem um alto valor agregado, principalmente na Ásia e Pacífico e que atualmente são as regiões com o maior foco de atenção em relação a fraudes fora da Europa (Porém, ressaltamos que isso pode mudar muito rapidamente);

– o crescimento explosivo do ‘e-commerce’ de alimentos, ou seja, os alimentos vendidos pela internet e entregues via ‘delivery’ onde a inflação impacta no aumento do custo de produção devido ao crescimento do preço das matérias-primas, insumos e combustíveis para a entrega desses produtos.

Em todos esses casos citados acima, a probabilidade de fraude é aumentada por motivos óbvios já que possibilitam a oportunidade de ganhos financeiros pelos criminosos.

2) Aumento da atuação dos Órgãos Públicos e a Polícia:

Recentemente aqui no Brasil, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) em conjunto com a Polícia Civil fez a maior operação de destruição de azeite de oliva fraudado já realizada no país. Uma notícia muito animadora e positiva, mas que necessita ser mais frequente e constante.

Na Europa, por exemplo, houve um aumento da cooperação entre os países membros da Comunidade Europeia no combate à fraude em alimentos estimulando a troca de informações para a identificação, investigação e eliminação de práticas com a criação em 2013 da ‘EU Food Fraud Network’ (EU FFN) após o grande escândalo da carne de cavalo.

Esta rede europeia de fraude em alimentos tem a participação da EUROPOL – que é um serviço Europeu de polícia, incumbido do tratamento e intercâmbio de informação criminal – e de autoridades competentes dos países da União Europeia. 

A elaboração e implementação de novos regulamentos/leis, por exemplo para controles oficiais por parte dos Órgãos Governamentais, também é de extrema importância pois permite uma maior proteção para as empresas, clientes e consumidores. Com tudo isso, diversas operações foram realizadas no continente europeu.

3) Aumento do investimento em tecnologias:

Na Europa desde 2016, há um investimento grande em tecnologias específicas para o combate a fraudes alimentares com o intuito de facilitar e permitir que os países europeus troquem dados confidenciais de forma estruturada e segura, como:

– um Sistema de Assistência Administrativa e Cooperação para Fraudes Alimentares (sistema AAC-FF). 

Isso trouxe em 3 anos um aumento de 85% no número de casos notificados relacionados a fraude em alimentos, além de proporcionar informações estatísticas importantes para o conhecimento e planejamento de ações:

– Quando se trata de categorias de produtos os ‘top quatro’ que representam mais de 68% das denúncias são:

  • Óleos e gorduras (44 denúncias): sendo o ‘azeite’ como o produto mais notificado do sistema
  • Peixes (42)
  • Produtos à base de carne (38)
  • Frutas e legumes (28)

Fonte: Annual Report – The EU Food Fraud Network and the Administrative Assistance and Cooperation System

Em comparação com o passado, onde alguns alimentos tinham uma atenção maior, como ‘alimentos dietéticos e suplemento’, ‘subprodutos para animais’ e ‘mel e geleia real’, recentemente foram superados por ‘carne de aves’ (16), ervas e especiarias (12), ‘cereais e produtos de panificação’ (11), bebidas alcoólicas (10) e ‘Nozes, derivados e sementes’ (10).

Fonte: Annual Report – The EU Food Fraud Network and the Administrative Assistance and Cooperation System

As cinco principais violações registradas são:

  • Rotulagem incorreta (representa 47,3% do total). Ex.: produtos rotulados como orgânicos e que na realidade não o são;
  • Substituição/diluição/adição/remoção em produto (20%). Ex.: orégano misturado com folhas de oliva;
  • Problemas com documentos: ausência, falsificação ou manipulação (15%). Ex.: principalmente com documentação de rastreabilidade relacionado aos produtos de carne e peixe (documentos adulterados, registros e chips eletrônicos falsificados, sem a documentação necessária, etc.);  
  • Tratamento e/ou processo não aprovados por lei (16%). Ex.: tratamento não aprovado de frutas e hortaliças com químicos não-autorizados, atum com nitrito ou monóxido de carbono (utilizados para melhorar a cor do produto e assim o cliente acreditar que  o produto é de melhor qualidade;
  • Infração dos direitos autorais ou de propriedade intelectual (2%). Ex.: vinhos ou azeites vindos de uma região muito específica. 

CONCLUSÃO:

A fraude em alimentos é um problema crescente no âmbito mundial e que causa imensos prejuízos financeiros todos os anos e, somente na Europa, o custo com danos é estimado em torno de 8 a 12 milhões de Euros.

Os requisitos de combate a fraudes incluídos nas normas reconhecidas pelo GFSI são importantes, mas não suficientes.

Todo o complexo e mutável mundo dos crimes de fraudes alimentares necessitam de muito mais e concluímos que recursos para três áreas de atuação são essenciais:

regulamentação (criação de leis);

cooperação e a comunicação;

uso de tecnologia (sistemas informatizados seguros e interligados).

A elaboração de regulamentos de controles oficiais obrigando os países e outras partes interessadas a denunciar todas as suspeitas de fraudes, principalmente nas fronteiras e pontos de recebimento de mercadorias importadas e exportadas, como portos e aeroportos é essencial.

A promoção do diálogo entre os países na luta contra a fraude em alimentos é de fundamental importância.

O aumento da cooperação entre os países no combate à fraude em alimentos estimulando a troca de informações para a identificação, investigação e eliminação de más práticas, além do aumento dos investimentos financeiros em sistemas informatizados e equipes para a extração, preparação e pré-análise dos dados em operações de combate a fraudes coordenados pelos países é fundamental para se ter mecanismos eficientes de controle, monitoramento, ação e resposta rápida.

Por fim, a regulamentação, a troca eficiente de informações e a cooperação são elementos essenciais na investigação efetiva de fraudes entre:  

– denunciantes;

– órgãos governamentais, polícia e órgãos internacionais (FAO, Codex);

– operadores (ex. fabricantes);

– mídia.

Todo esse conjunto resultará em um maior volume de punições e apreensões, por consequência de um sistema global mais efetivo de combate a fraudes.

 

Referências:

https://www.linkedin.com/posts/maur%C3%ADcio-kamei-0065698_food-fraud-fao-activity-6779200758161125376-_Ntv

https://ec.europa.eu/info/food-farming-fisheries/food-safety-and-quality/fraud-monitoring-and-controls_en

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