Alérgenos: a causa mais comum de Recall em todo mundo
As adversidades relacionadas à segurança dos alimentos são uma questão pública que vêm ganhando destaque internacional. Frequentemente, incidentes relacionados à segurança de alimentos são notificados na cadeia de abastecimento de alimentos, e são afetados diretamente pela melhoria dos sistemas de vigilância e notificação, e também pelo aumento do grau de informação dos consumidores que estão mais exigentes, melhor informados em relação aos produtos que consomem e aos seus direitos.
Recall é uma palavra da língua inglesa que significa “chamamento”, e segundo o Ministério da Justiça é “a forma pela qual um fornecedor vem a público informar que seu produto ou serviço apresenta riscos aos consumidores. Ao mesmo tempo, recolhe produtos, esclarece fatos e apresenta soluções” (BRASIL, 2020).
Segundo Soon e Wahab (2021), a cada dia cresce em todo mundo o número de recalls de alimentos associados a alérgenos alimentares não declarados nos rótulos dos produtos, afetando diretamente a saúde dos seus consumidores, causando um impacto negativo na imagem da empresa e na sua área financeira, já que é necessário administrar todo o custo envolvendo a saúde dos seus clientes, a comunicação, o recolhimento e o descarte desses produtos.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) regulamenta o recolhimento de alimentos no Brasil através da Resolução da Diretoria Colegiada – RDC nº 655, de 24 de março de 2022, que dispõe sobre o recolhimento de alimentos e sua comunicação à ANVISA e aos consumidores e a RDC nº 275, de 21 de outubro de 2002, determina que os estabelecimentos produtores ou industrializadores de alimentos devem desenvolver, implementar e manter o Procedimento Operacional Padronizado (POP) para o programa de recolhimento de alimentos.
A alergia alimentar vem se tornando cada vez mais comum em todo mundo, onde aproximadamente 10% da população em países desenvolvidos enfrentam algum tipo de alergia alimentar (NAÇÕES UNIDAS BRASIL, 2022). No Reino Unido, em torno de 30% dos adultos apresentaram reações adversas ao consumir alimentos, e destes estima-se que 6% da população adulta tenha alergia alimentar mediada por IgE confirmada clinicamente, o que equivale a cerca de 2,4 milhões de pessoas (FOOD STANDARDS AGENCY, 2024). De 2014 a 2020, as hospitalizações devido a reações alérgicas a alimentos corresponderam a 65% dos casos de atendimentos médicos ligados à ingestão de alimentos, apresentando um crescimento total de 49,7% (YUE et al; 2023). Calcula-se que anualmente somente no Reino Unido sejam gastos em torno de 80 milhões de euros exclusivamente com hospitalizações e casos de hipersensibilidade alimentar (FOOD STANDARDS AGENCY, 2020).
Na União Europeia, o Regulamento 1.169/2011 indica 14 substâncias ou produtos que provocam alergias ou intolerâncias de interesse relevante, sendo eles: aipo, cereais contendo glúten, crustáceos, ovos, peixe, tremoço, leite, moluscos, mostarda, amendoim, gergelim, soja, dióxido de enxofre e sulfitos (se estiverem em concentração superior a dez partes por milhão) e nozes.
Nos EUA, o FDA (Food and Drug Administration) através da Lei de Alimentos, Medicamentos e Cosméticos indica como os principais alérgenos alimentares: leite, ovos, peixe, crustáceos, nozes, amendoim, trigo, soja e gergelim. A Comissão do Codex Alimentarius definiu os alérgenos “prioritários” conhecidos como “Big 8”: leite, ovo, peixe, crustáceos, nozes, amendoim, trigo, soja, além de sulfitos (em concentrações de 10 mg/kg ou mais).
No Brasil a RDC nº 727, de 1° de julho de 2022 estabelece regras sobre a rotulagem dos alimentos, bebidas, ingredientes, aditivos alimentares e coadjuvantes de tecnologia embalados na ausência do consumidor, incluindo advertências sobre os principais alimentos que causam alergias alimentares, com intuito de garantir que os consumidores tenham acesso a informações claras e seguras sobre a presença de alergênicos nos alimentos.
Os principais alimentos alergênicos são definidos considerando sua relevância para a saúde pública e a complexidade da cadeia produtiva brasileira, e são eles: trigo, centeio, cevada, aveia e suas estirpes hibridizadas; crustáceos; ovos; peixes; amendoim; soja; leites de todas as espécies de animais mamíferos; amêndoa (Prunus dulcis, sin.: Prunus amygdalus, Amygdalus communis L.); avelãs (Corylus spp.); castanha-de-caju (Anacardium occidentale); castanha-do- brasil ou castanha-do-pará (Bertholletia excelsa); macadâmias (Macadamia spp.); nozes (Juglans spp.); pecãs (Carya spp.); pistaches (Pistacia spp.); pinoli (Pinus spp.); castanhas (Castanea spp.); e látex natural (BRASIL, 2022).
Segundo dados do RASFF (Rapid Alert System for Food and Feed), 241 alimentos foram notificados de 2020 a 2024, sendo 74,3% notificações por alergênico ou presença de glúten não declarados no rótulo, e 25,7% por contaminação cruzada. Dados do FDA indicam que de 2008 a 2024, 650 alimentos sofreram recall, sendo 227 relacionados a alergênicos, e destes, 96,5% foram por alergênico ou presença de glúten não declarados no rótulo e 3,5% por possível contaminação cruzada. No Brasil, segundo dados abertos de recalls do Ministério da Justiça, de 2004 a 2021 foram realizados 49 recalls de alimentos, sendo 22,4% por alergênico ou presença de glúten não declarados no rótulo (Brasil, 2024). Esses dados expressam com clareza que os fatores erro na rotulagem e contaminação cruzada são importantes causadores de recall em alimentos, ocasionando a presença do alergênico não declarado no rótulo.
Os consumidores com alergias alimentares confiam nos fabricantes de alimentos para o fornecimento de informações precisas sobre alérgenos nos rótulos dos produtos. O rótulo cumpre não só a função de informar o consumidor a respeito do conteúdo do produto como também é um requisito regulamentar. A rotulagem deve ser feita de forma fiel à composição dos alimentos, deve haver uma adequada gestão de alérgenos e rigorosa comunicação sobre os mesmos, ao longo da cadeia de abastecimento (THESMAR, 2024).
Se faz necessário um sistema de rastreabilidade e recolhimento eficientes caso ocorram incidentes alimentares; por isso é primordial a adoção de ferramentas de gestão e comunicação de riscos como estratégias para garantir a segurança dos alimentos, no entanto pode ser desafiador para empresas de pequeno e médio porte, devido à complexidade de todo o processo (JIA e EVANS, 2022).
É essencial a ação dos órgãos reguladores atuando na fiscalização desses produtos, com o intuito de garantir os direitos do consumidor. Entender as causas e a incidência dos recalls causados por alérgenos alimentares pode auxiliar na identificação de práticas, tendências ou padrões que possam contribuir para a sua ocorrência e instituir medidas eficientes para evitá-los (SHARMA et al., 2023).
REFERÊNCIAS
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- BRASIL. Ministério da Justiça. Ministério da Justiça e Segurança Pública. Dados abertos de Recalls de 2002 a 2022. Brasília.2024. Disponível em: https://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/seus-direitos/consumidor/defesadoconsumidor Acesso em: 04 mai. 2024.
- BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária- ANVISA. Resolução da Diretoria Colegiada – RDC nº 727, de 01 de Julho de 2022. Brasília. 2022e. Disponível em: https://antigo.anvisa.gov.br/documents/10181/2718376/RDC_727_2022_.pdf Acesso em: 02 fev. 2024.
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