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Farinha de casca de ovos na alimentação humana: uma pegada ecológica

Introdução

 Nos últimos anos, a produção de ovos tem crescido significativamente, acompanhada por uma alta demanda, que por sua vez gera mais desperdícios, especialmente com o descarte das cascas. Contudo, as cascas de ovos são uma excelente fonte de cálcio, representam uma alternativa ecológica e financeiramente viável para a obtenção desse mineral essencial. (Matteucci et al., 2023).

A produção brasileira de ovos de galinha alcançou no ano de 2022, 52 bilhões de unidades, com valor bruto de produção de R$ 20,2 bilhões, exportação de 9,4 mil toneladas (US$ 22,4 milhões) para 89 países (correspondendo a 0,44% da produção total do Brasil), colocando o país em 5° lugar no ranking mundial. O consumo per capita, segundo os dados, foi de 241 unidades anual por habitante, destacando o crescimento desse setor no país (ABPA, 2023). 

O desenvolvimento rural de forma sustentável e equilibrada atualmente é uma preocupação nas agroindústrias e cooperativas. E um dos pontos mais importantes envolve os impactos ambientais ocasionados por atividades agroindustriais, maximizadas pela ausência de um sistema de gerenciamento ambiental adequado por parte da organização. Pois, o descarte inadequado dos resíduos gerados contribui para a poluição dos rios e solos, lixiviação de compostos e proliferação de vetores transmissores de doenças, acarretando em problemas de saúde pública (Campos et al., 2023).  A casca representa cerca de 11% do peso total do ovo, portanto, o resíduo gerado pode ser estimado em cerca de 6,82 milhões de toneladas por ano globalmente (OLIVEIRA et al., 2013).

A farinha da casca de ovo é um meio ecológico de inserir cálcio na dieta de diversos animais como bovinos, aves, suínos e podendo ser introduzido na alimentação de animais domésticos e seres humanos de maneira sustentável e viável economicamente, além do cálcio ela também é rica em outros minerais (Ferarezi, 2021).

O cálcio tem uma extrema importância no metabolismo dos seres vivos, ajudando no circulatório do sangue, contração muscular, estrutura óssea e auxilia na transmissão de impulsos nervosos. O cálcio é absorvido no começo do intestino delgado, assim levando para o restante do corpo (Marcos, 2020).

O cálcio é um elemento essencial para a constituição da casca do ovo. Para uma boa formação da casca do ovo de aves, onde a galinha poedeira precisa receber aproximadamente 4,1 g/dia de cálcio, para que ela consiga depositar na casca, repor perdas fisiológicas e manter a homeostasia iônica, que é regulada pela concentração do cálcio, na forma ionizada (Rodrigues, 2019). 

Sua utilização traz fortificação de alimentos, podendo constituir uma estratégia valiosa para aumentar a ingestão diária de cálcio e atender as necessidades da população que apresenta deficiência desse micronutriente (Pandolfi et al., 2023). 

Contudo, o objetivo deste artigo técnico é relatar a inclusão de farinha de casca de ovos na alimentação, como substituto ecológico de fontes tradicionais de cálcio.

Formação da casca de ovo na galinha 

A casca do ovo tem o início da sua formação no útero dentro do oviduto da galinha; esta é uma região supersaturada com cálcio e bicarbonato (Figura 1). A parte mineral da casca é constituída por 98,2% de carbonato de cálcio, 0,9% de carbonato de magnésio e 0,9% de fosfato de cálcio (RODRIGUEZ-NAVARRO et al., 2002; ORDÓNEZ, 2005).

Figura 1. Anatomia do oviduto e formação do ovo. / Fonte: eagaspar anatomia (2005)

O processo de formação da casca se inicia com a deposição de cristais de carbonato de cálcio em sítios específicos, sobre as fibras orgânicas das membranas externa e interna da casca. Após vários processos, o ovo é formado (Regina & Porto, 2018, NYS et al., 2004). A casca do ovo de galinha, é rico em Ca na forma de carbonato de cálcio (CaCO3) (Gressler et al., 2015). 

  A casca do ovo das aves é composta por seis camadas onde duas dessas camadas internas são membranas não calcificadas, enquanto as camadas externas são formadas por fibras proteicas entrelaçadas, que suportam a casca mineralizada. A casca mineralizada está ancorada a sítios de nucleação, os botões mamilares, que são estruturas ricas em matéria orgânica distribuídas Semiperiódico na superfície da membrana externa da casca do ovo. Agregados esferulíticos de cristais de calcita formam uma matriz de cones invertidos (camada mamilar) que se fundem para formar a camada compacta de paliçada à medida que a mineralização prossegue (Gautron et al. ,2021).

Sendo composta por substâncias orgânicas e inorgânicas. Quando in natura, é composta por carbonato de cálcio na forma de calcita (94% em massa), fosfato de cálcio (1% em massa), carbonato de magnésio (1% em massa) e matéria orgânica (4% em massa), conforme relatado por KUMAR et al. (2022). A película interna que forma o revestimento da casca consiste na parte orgânica que é formada por glicoproteínas, mucoproteínas, colágeno e mucopolissacarídeos, enquanto compostos como CaCO3, MgCO3 e Ca3(PO4)2 formam a parte inorgânica (CORREA et al., 2015).

A casca de ovo é um dos biomateriais mais comuns na natureza. Como subproduto da indústria de alimentos, representam um desperdício significativo, pois são descartados após a utilização da gema de ovo e da albumina (Lesnierowski & Stangierski, 2018).

Considerando o aspecto químico da casca do ovo, ela é composta por água (2%) e matéria seca (98%). A matéria seca, por sua vez, é composta por 93% de cinzas e 5% de proteína bruta (Safitri, Supriyana, & Bahiyatun, 2017). 

A galinha necessita de cálcio em sua dieta que será utilizada para diferentes reações fisiológicas e bioquímicas, além da formação da casca. Assim a obtenção desse mineral se dá através da nutrição e da absorção de diferentes alimentos. 

Fontes tradicionais de cálcio para galinhas em postura 

A quantidade adequada de cálcio na dieta é importante para manter a qualidade da casca do ovo e deve aumentar proporcionalmente com a idade de postura de cada ave. No início da postura, a exigência de cálcio é de 1%; após esse período sobe para 3,5% e eleva-se gradativamente. Esse aumento na exigência do cálcio em aves mais velhas ocorre devido ao aumento no tamanho dos ovos e redução nas taxas de absorção intestinal (COSTA et al., 2008).

As fontes de minerais comumente utilizadas na nutrição animal, para suprir a exigência de cálcio nas rações, são os compostos inorgânicos, provenientes de rochas, como o calcário e o fosfato bicálcico, por serem mais abundantes na natureza e de menor custo (DELFIM, 2019).

O calcário calcítico (Figura 2) é uma rocha sedimentar de origem orgânica, sendo composta principalmente de carbonato de cálcio na forma dos minerais calcita e aragonita (Couto et al., 2008).

Figura 2. Calcário calcítico / Fonte: dos autores.

O fosfato bicálcico e o fosfato monocálcico (Figura 3), suplemento de fósforo para animais amplamente empregado nas rações, resultado da acidificação do concentrado apatítico, proveniente da flotação da rocha finamente moída, normalmente, com ácido sulfúrico, resultando em ácido fosfórico, que é desfluorizado (Teixeira et al., 2005).

Figura 3. Fosfato bicálcico / Fonte: dos autores

Utilização de farinha da casca do ovo como meio sustentável de cálcio

As cascas de ovos possuem um teor de cálcio de aproximadamente 38%, tendo a possibilidade de ser utilizado para as mais diversas finalidades, incluindo a nutrição humana. O cálcio presente na farinha de cascas de ovos é biodisponível, indicando que esse produto pode ser introduzido na alimentação. Sua utilização na forma de farinha promove uma redução no descarte das cascas dos ovos, que geralmente são descartadas por indústrias e resultam em desperdício (Waheed et al., 2019, Neves, 2007).

A farinha de casca de ovo é utilizada em preparações visando combater a desnutrição, contribuir para o crescimento e o fortalecimento completo dos ossos e dos dentes, entre outros fatores indispensáveis para os organismos vivos, onde é importante ressaltar que a única fonte disponível de cálcio para o organismo humano é obtida da dieta, onde é encontrada nos alimentos ingeridos. A ingestão adequada de cálcio durante as etapas da vida dos seres humanos e animais também retarda o processo de perda óssea e consequente desenvolvimento da doença osteoporose (BEDANI; ROSSI, 2005; Lima et al., 2021).

Podendo ser uma opção de baixo custo e fácil obter para atender as necessidades nutricionais (Figura 4). A valorização deste subproduto pode reduzir a extração de reservas naturais não-renováveis de CaCO3, como rocha calcária (OLIVEIRA et al., 2013).

Figura 4. Casca de ovos de galinha quebradas e triturada / Fonte: dos autores.

 À medida que as gerações progridem, a atenção para cumprir a ingestão de cálcio necessária em humanos está diminuindo rapidamente, e cujas consequências podem levar a uma menor densidade óssea e a muitas doenças, como osteoporose e hipocalcemia. Quase 200 milhões de pessoas em todo o mundo enfrentam osteoporose (Shang e Wu, 2019). A osteoporose causa uma diminuição constante na densidade óssea (Yedavally-Yellayi et al., 2019). A menor ingestão de cálcio também resulta em ossos mais frágeis e deterioração da estrutura óssea (Arnold et al., 2021).

Conclusão 

 A farinha da casca de ovo é um meio ecológico de introdução de cálcio na alimentação dos seres humanos, podendo ser acrescentada em pães, iogurtes, bolos etc., de maneira sustentável e viável economicamente. Além disso, o cálcio tem uma extrema importância no metabolismo humano e animal, ajudando na circulação sanguínea, contração muscular, estrutura óssea e auxilia na transmissão de impulsos nervosos, onde nas galinhas é um elemento essencial para a constituição da casca do ovo. 

Nos seres humanos, a necessidade de ingestão de cálcio torna-se importante, sendo dependente de vários fatores, como idade, sexo, estado de saúde e alimentação, como na formação óssea em crianças e reposição em adultos ao longo da vida.  Nesse contexto, a farinha de casca de ovo tem se destacado como uma alternativa versátil e ecológica, sendo cada vez mais incorporada à alimentação humana e contribuindo para a redução do desperdício. 

 

Referências

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