Cerveja verde: Uso de microalgas na produção de cerveja.

Introdução

A utilização de microalgas como fonte de alimento é relatada em diversas civilizações, destacando as espécies do gênero Nostoc e Spirulina. Em diversos povos, obtinha-se a biomassa a partir do acúmulo de algas em margens de rios e lagos, posteriormente secadas ao sol para obtenção da biomassa (AARONSON, BERNER e DUBINSKY, 1980; DURAND-CHASTEL, 1980; CIFERRI e TIBONI, 1985; DILLON, PHUC e DUBACQ, 1995).

Contudo, o interesse no cultivo de microalgas atraiu forte atenção somente em décadas recentes. Ao longo do século XX, produtores e pesquisadores desenvolveram técnicas de cultivo em tanques abertos, assim como em fotobiorreatores fechados para a produção de biomassa (APT e BEHRENS, 1999; TREDICI, 1999). As microalgas, como a Spirulina e a Chlorella, são organismos unicelulares ricos em nutrientes, como proteínas, vitaminas e antioxidantes. Elas são cultivadas em sistemas aquáticos, muitas vezes aproveitando os resíduos de nutrientes da aquicultura, o que torna o processo mais eficiente e amigável ao meio ambiente (BECKER, 2013).

A produção em nível comercial de microalgas iniciou-se na década de 60 utilizando as espécies Chlorella e Spirulina, aplicadas como suplementos alimentares, Dunaliella salina na aquisição de β-caroteno, Haematococcus pluvialis para produção de astaxantina e outras espécies para aplicação na aquicultura. Na mesma década, as pesquisas biotecnológicas de microalgas concentravam-se no tratamento de águas residuais, aplicações em programas espaciais de renovação atmosférica e como fonte de alimento.

As microalgas são microrganismos heterogêneos, comumente microscópicos, unicelulares, coloniais ou filamentosos, coloridos e fotoautotróficos. Filogeneticamente, se apresentam procariontes ou eucariontes. A biomassa resultante do cultivo de
microalgas destina-se às mais variadas aplicações, como produção de proteína unicelular, lipídeos, carotenóides, clorofila, enzimas, ésteres, antibióticos, hidrocarbonetos e vitaminas (BENEMAN, 1990; OLAIZOLA, 2003; DURAND-CHASTEL, 1980; RICHMOND, 1988; BECKER, 1994; PULZ e GROSS, 2004; RICHMOND, 2004).

Desenvolvimento 


Como Elas São Usadas na Cerveja?

Esses pequenos organismos podem ser adicionados à cerveja em diferentes estágios da produção, como na fermentação ou no acabamento. A Spirulina, por exemplo, pode dar à cerveja uma cor azul-esverdeada vibrante e um leve sabor herbáceo. Além disso, a adição de microalgas aumenta o valor nutricional da bebida, tornando-a uma opção mais saudável (RICHMOND, 2008).

Principais Espécies Utilizadas no Brasil

No Brasil, as microalgas mais comumente exploradas para consumo humano incluem a Spirulina (Arthrospira platensis) e a Chlorella (Chlorella vulgaris). Essas espécies são amplamente estudadas devido ao seu alto teor proteico, presença de antioxidantes e capacidade de crescimento em diferentes condições ambientais. Além disso, outras espécies como a Dunaliella salina, rica em β-caroteno, e a Haematococcus pluvialis, utilizada para produção de astaxantina, têm despertado interesse na indústria de alimentos e bebidas. Na produção de cerveja, essas microalgas podem ser utilizadas para conferir propriedades funcionais e sensoriais específicas. A Spirulina, por exemplo, além de fornecer um tom esverdeado à bebida, pode contribuir com compostos bioativos benéficos à saúde. Já a Chlorella tem sido estudada por sua capacidade de influenciar o perfil sensorial da cerveja, tornando-a mais encorpada e com notas herbáceas sutis.

Sistemas de Produção Existentes

Os sistemas de produção de microalgas podem ser classificados em três principais categorias: tanques abertos, fotobiorreatores fechados e sistemas híbridos.

I. Tanques abertos: São os sistemas mais antigos e utilizados em larga escala devido ao baixo custo de implementação e operação. Eles consistem em lagoas ou canais rasos nos quais as microalgas são cultivadas com aeração contínua. No entanto, esses sistemas apresentam desafios como contaminação por outras algas e microrganismos indesejados, além da dependência das condições climáticas.

II. Fotobiorreatores fechados: São sistemas mais controlados e eficientes, permitindo a otimização da produção com menor risco de contaminação. Esses reatores utilizam tubos transparentes ou placas planas nos quais as microalgas crescem em condições controladas de luz, temperatura e nutrientes. Apesar do custo inicial elevado, oferecem maior produtividade e qualidade da biomassa obtida.

III. Sistemas híbridos: Combinam características dos dois sistemas anteriores, aproveitando o baixo custo dos tanques abertos com a maior eficiência dos fotobiorreatores fechados. Esses sistemas são promissores para a produção de microalgas em escala comercial, especialmente em países tropicais como o Brasil, onde as condições climáticas favorecem o cultivo ao ar livre.

Uma Tendência em Crescimento Cervejarias ao redor do mundo já começaram a explorar o potencial das microalgas. Pesquisas apontam que o uso de microalgas na produção de alimentos e bebidas deve crescer nos próximos anos, impulsionado pela busca por alternativas sustentáveis e inovadoras (PULZ & GROSS, 2004). Apesar das vantagens, o uso de microalgas requer cuidados. Regulamentações sobre novos ingredientes em alimentos e bebidas precisam ser respeitadas, e o custo de produção ainda pode ser um desafio para a ampla adoção (MORALES-SÁNCHEZ et al., 2017).

Conclusão


A utilização de microalgas na produção de cerveja representa uma inovação promissora, combinando sustentabilidade, saúde e criatividade. A exploração desse novo ingrediente pode agregar valor à indústria cervejeira, criando produtos diferenciados e atraindo consumidores interessados em opções mais saudáveis e sustentáveis. Entretanto, para que essa tendência se consolide, desafios como regulamentação, custos de produção e estabilidade dos compostos precisam ser enfrentados com pesquisa e desenvolvimento.

Referências
● AARONSON, S.; BERNER, T.; DUBINSKY, Z. Algal biomass accumulation and carbon fixation within periphyton mats. Journal of Phycology, v. 16, n. 2, p. 203-209, 1980.
● APT, K. E.; BEHRENS, P. W. Commercial developments in microalgal biotechnology. Journal of Phycology, v. 35, n. 2, p. 215 226, 1999.
● BECKER, E. W. Microalgae: biotechnology and microbiology. Cambridge: Cambridge University Press, 1994.
● BECKER, E. W. Microalgae for human and animal nutrition. In: RICHMOND, A.; HU,
● Q. (Eds.). Handbook of microalgal culture: applied phycology and biotechnology. 2. ed. Oxford: John Wiley & Sons, p. 461-503, 2013.
● BENEMAN, J. R. Microalgae biotechnology. Trends in Biotechnology, v. 8, n. 1, p. 41- 45, 1990.
● CIFERRI, O.; TIBONI, O. The biochemistry and industrial potential of Spirulina. Annual Review of Microbiology, v. 39, p. 503-526, 1985.
● DILLON, J. C.; PHUC, A. P.; DUBACQ, J. P. Nutritional value of the alga Spirulina. World Review of Nutrition and Dietetics, v. 77, p. 32-46, 1995.
● DURAND-CHASTEL, H. Algues et productions aquatiques. Paris: Gauthier- Villars, 1980.
● MORALES-SÁNCHEZ, D. et al. Microalgae-based biodiesel: Economic analysis of various production scenarios. Biotechnology Advances, v. 35, n. 6, p. 692-703, 2017.
● OLAIZOLA, M. Commercial development of microalgal biotechnology: from the test tube to the marketplace. Biomolecular Engineering, v. 20, n. 4-6, p. 459-466, 2003.
● PULZ, O.; GROSS, W. Valuable products from biotechnology of microalgae. Applied Microbiology and Biotechnology, v. 65, n. 6, p. 635-648, 2004.
● RICHMOND, A. Microalgal biotechnology at the turn of the millennium: a personal view. Journal of Applied Phycology, v. 12, n. 3-5, p. 441-451, 2000.
● TREDICI, M. R. Photobioreactors: history, applications and future prospects. Journal of Applied Phycology, v. 6, n. 3, p. 209-210, 1999.

Total
0
Shares
Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Leia mais