Logo após concluir a faculdade de engenharia química, fui contratada para implementar Gestão da Qualidade na área de Distribuição & Logística de uma grande empresa de bebidas. Obviamente passei por uma intensa capacitação sobre Ferramentas da Qualidade, utilizando o método PDCA (que uso até hoje em praticamente todos os meus projetos!). Até então, minha visão sobre Qualidade estava muito associada à conformidade dos processos industriais, envolvendo requisitos, limites e normas para a produção das bebidas.
Ao ingressar na área de Logística, minha percepção mudou totalmente – ali percebi que, se os conceitos de Qualidade não forem praticados nas etapas da cadeia além da produção, nossos índices de reclamações de consumidores não apresentarão melhorias. Ali também compreendi o real valor da Qualidade levada a sério por todas as etapas e áreas de uma indústria de alimentos – reduzir perdas e aumentar vendas. Sim! Qualidade não está associada somente a certificados e aumento da satisfação de consumidores (que são importantes), mas em termos, em nossa cadeia de abastecimento de alimentos, menos desperdício de recursos e produtos. Isso é possível através de conceitos similares aos aplicados na produção, porém adequados às atividades nos armazéns e transportes – estamos falando de Boas Práticas de Armazenagem e Manuseio, controles de FEFO (First Expire, First Out), temperatura, umidade etc. Produtos armazenados de forma correta, evitam problemas nas entregas – qual cliente aceitará produtos danificados? E se aceitar, certamente transmitirá sua insatisfação de alguma forma, até mesmo reduzindo suas compras.
Anos depois, me deparei com um novo desafio na área de Distribuição & Logística e na mesma empresa. Na época eu era gerente da Qualidade e fui “desafiada” pela alta direção a auxiliar os times de estoques na prevenção de perdas de produtos. Estávamos nos preparando para o período de altas vendas e a diretora de Operações demonstrou preocupação com as condições de estocagem e – a parte do desafio vem agora – o envelhecimento dos produtos. Eu pensei: “Ok, não entendi porque esse tema veio pra mim, mas vamos lá!”. Fiz benchmarking em outra fábrica do grupo na Argentina e me debrucei sobre o tema. Foi quando eu aprendi (e muito!) sobre a importância do giro dos alimentos na cadeia, não somente para evitar a perda dos produtos por vencimento, mas porque alimentos frescos guardam melhor suas características sensoriais. Ou seja, eu estava tendo a oportunidade de trabalhar em uma iniciativa que ligava Qualidade e Produtividade, e sendo tratado como prioridade pela alta direção da empresa!
Neste trabalho foram construídas rotinas de acompanhamento dos estoques, que geravam dados e que possibilitaram a implementação de indicadores. Dentre eles, gostaria de citar dois, que acredito poderem ser replicados em qualquer tipo de indústria de alimentos:
- Idade dos produtos
- Pode ser acompanhada em dias ou em %. Nessa última forma, basta dividir a quantidade de dias após a produção (dia da amostragem – dia da produção) pela quantidade total de dias do shelf-life daquele produto.
- Exemplo:
- Um produto tem 100 dias de shelf-life;
- No momento da amostragem já havia se passado 25 dias após a fabricação dele;
- Idade do produto = 25/100 = 0,25 * 100 = 25%
- Esse indicador fornece alertas de envelhecimento de produtos no estoque e pode ser comparado com a política de estoques definida pela área de planejamento.
- Conformidade das Boas Práticas de Armazenagem
- Pode ser gerado através de um checklist e/ou de uma auditoria, mas eu recomendo fortemente que você liste os itens mais críticos ou que mais impactam nas reclamações de consumidores.
- Por exemplo, se a empresa recebe muitas reclamações relacionadas à alteração do alimento devido a embalagens danificadas, certamente um item a ser avaliado será a presença desse problema nos armazéns.
- A partir dos itens que você selecionar, calcule o indicador da seguinte forma: quantidade de itens conformes dividido pela quantidade de itens avaliados.
- Exemplo:
- Definimos que serão 10 itens avaliados;
- 9 estavam adequadamente atendidos;
- % de conformidade = 9/10 = 0,9 * 100 = 90%
- Esse indicador promove a melhoria contínua e permite a identificação de necessidades de adequação.
- Pode ser gerado através de um checklist e/ou de uma auditoria, mas eu recomendo fortemente que você liste os itens mais críticos ou que mais impactam nas reclamações de consumidores.
Outros indicadores podem ser aplicados, inclusive nas operações de transporte (entregas e transferências). O importante é que essas etapas façam parte do sistema de gestão da qualidade e segurança dos alimentos, de forma tão intensa e engajada quanto na produção. Isso certamente irá colaborar para a melhoria e sustentabilidade do negócio, incluindo satisfação de clientes e consumidores, indicadores financeiros e Market Share.