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Uso da nebulização na indústria de alimentos

Uma opção para a descontaminação de ambientes de processamento.

É cada vez mais importante se atentar às condições higiênico sanitárias na produção de alimentos, para garantir uma produção de alimentos seguros, evitando assim, as DTA (Doenças Transmitidas por Alimentos). As DTA são provocadas por microrganismos patogênicos que contaminam os alimentos de diversas formas, desde contaminações na própria matéria prima, falhas durante o processamento, até problemas relacionados a higienização ineficaz.

O processo de higienização é formado por duas etapas: limpeza e sanitização. A etapa de limpeza se trata da remoção de sujidades das superfícies, geralmente feita pelo uso de detergentes, enquanto a etapa de sanitização, é responsável por reduzir a carga microbiana, utilizando o emprego de agentes químicos (ex: ácido peracético) ou físicos (ex: vapor). Para uma higienização eficiente, além da escolha da técnica ideal, deve-se realizar o controle de quatro fatores primordiais, definidos no círculo de Sinner. São eles: ação mecânica, tempo de aplicação e atuação dos agentes da higienização, a temperatura dos agentes e a concentração química das soluções. Tais fatores devem ser utilizados/controlados em combinação, pois caso um dos fatores esteja fora do critério estabelecido, afeta diretamente a eficiência do processo.

Apesar do processo de higienização apresentar grande relevância para a produção de alimentos seguros, esta etapa é muitas vezes negligenciada ou subjugada, durante a produção de alimentos. Além disso, as técnicas convencionais não são suficientes para eliminar contaminações presentes no ambiente de processamento, podendo resultar, em alguns casos, em uma recontaminação nos equipamentos, o que afeta consequentemente a produção de alimentos. 

Assim, técnicas adicionais de higienização que permitam uma descontaminação ambiental eficiente, podem auxiliar na garantia da segurança microbiológica de alimentos, além de favorecer o aumento do shellife e a redução do uso de conservantes em alimentos. Vale destacar que, para a escolha da técnica ideal é essencial que o método a ser adotado não cause alterações indesejadas, como: corrosões em equipamentos, perigos químicos para os alimentos e para manipuladores, e que não se torne caro para a indústria, pois assim seria inviável a sua plena adoção. 

Neste cenário, a técnica da nebulização química, conhecida também como, aerossolização, apresenta-se como uma técnica adicional aos processos convencionais de higienização, promissora para produção de alimentos, uma vez que, além da descontaminação ambiental, pode ser utilizada na descontaminação superficial de equipamentos e alimentos. Apesar disso, a técnica ainda é pouco estudada e subutilizada na área de alimentos, sendo bastante difundida na área médica para descontaminação de ambientes hospitalares.

A nebulização se baseia na difusão do agente sanitizante líquido em uma névoa fina pelo ar, sendo o ácido peracético e o peróxido de hidrogênio os produtos mais utilizados. A difusão em névoa fina, resulta em quantidades menores de solução desinfetante se comparada a aplicação da forma líquida nas superfícies, possibilitando redução dos custos relacionados aos produtos químicos e do consumo de água. Além disso, promove uma cobertura 3D do ambiente de forma uniforme, garantindo assim, a descontaminação de locais de difícil acesso. 

Vale ressaltar que por utilizar produtos químicos, quando aplicada a técnica, deve-se isolar a área para evitar riscos à saúde dos manipuladores. Além disso, não deve haver produção de alimentos, para evitar contaminações químicas nos produtos. De forma geral, recomenda-se um período de espera entre 45 a 60 minutos após a aplicação, para liberação da área. A definição dos parâmetros de processo, como tempo de aplicação, concentração das soluções, devem ser avaliados através de análises microbiológicas para garantia da eficiência do processo. 

Aplicação da Nebulização na descontaminação de ambiental e de superfícies de equipamentos

Na literatura, poucas pesquisas reportam o efeito da nebulização na descontaminação ambiental em áreas de processamento em situação real em indústrias de alimentos. Em geral, as pesquisas são realizadas da seguinte forma: estudo de superfície em chapas de aço inox, simulando a superfície de equipamentos e através da simulação de áreas de produção de alimentos, geralmente utilizando câmaras e recipientes fechados. Estudos em situação real, podem acarretar riscos para produção, uma vez que para realização dos experimentos, comumente se faz contaminação proposital para posteriormente, avaliar o efeito da técnica. 

No estudo realizado por Choi et al (2012), foi avaliada a eficácia da nebulização na inativação da Escherichia coli O157:H7, Salmonella Typhimurium e Listeria monocytogenes presentes em cupons de aço inox, utilizando o peróxido de hidrogênio com 0,25% e 0,5%, nos tempos de 15, 30 e 60 minutos. Os tratamentos foram eficazes na redução dos níveis de microrganismos. Em outro estudo utilizando cupons de aço inox, Park et al. (2012) avaliaram o efeito da aerossolização com hipoclorito de sódio (100ppm), ácido peracético (100, 200 e 400 ppm) nos tempos de 5, 10, 30, e 50 minutos, na inativação de um mix de culturas (E. coli, S. Typhimurium e L. monocytogenes). O ácido peracético resultou em maiores reduções, onde após 10 min, reduções de 5 logs foram observadas para E. coli e S. Typhimurium, enquanto que para L. monocytogenes, tais reduções foram obtidas após 30 minutos.

KRISHNAN et al (2012), avaliaram o efeito da nebulização na descontaminação em cupons de aço inox, com ácido peracético líquido (solução comercial) na Escherichia coli, Staphylococcus aureus, esporos de Bacillus atrophaeus. Além de avaliar o efeito da nebulização na população desses microrganismos, os autores avaliaram os efeitos da técnica no funcionamento de equipamentos eletrônicos e computadores presente no ambiente do laboratório durante as aplicações. Como resultado, os autores constataram que a técnica foi eficiente na inativação microbiana, além de não verificar um comprometimento funcional após seis rodadas de exposição.

Já para descontaminação ambiental, Wood et al. (2013) avaliaram a eficácia esporicida da nebulização de peróxido de hidrogênio a 22% com ácido peracético a 4,5% sob diferentes condições (volume aerossolizado, tempo e umidade relativa). Foram utilizadas as cepas de B. atrophaeus e G. stearothermophilus para o teste. A nebulização se mostrou eficaz causando o efeito esporicida durante a descontaminação ambiental, obtendo uma redução de 2.64 e 4.78 logs para os microrganismos citados, respectivamente. Em outra pesquisa relacionado a descontaminação ambiental, SALUSTIANO et al. (2004) avaliaram o efeito da nebulização em ambiente de laticínio com diferentes soluções desinfetantes (digluconato de clorexidina – 1.000 e 2.000 mg.L −1; Ácido peracético – 45 e 75 mg.L −1; quaternário de amônio – 700 e 1200 mg.L-1), no controle microbiológico em áreas de processamento de leite após 0,5, 12 e 24 h. Para fungos e leveduras, foram observados uma redução de 1,5 log para 0,45 log com aplicação de digluconato de clorexidina a 2000 mg.L-1 e de 1,3 log para 0,5 log, utilizando quaternário de amônio a 700 mg.L-1. Para contagem de bactérias a aplicação de ácido peracético a 45 mg.L-1 reduziu a concentração de 2.1 log para 0.55 log.

Neste cenário, observa-se que o método é promissor para inativação de microrganismos em áreas de processamento de alimentos. Contudo, mais pesquisas devem ser realizadas para otimizar as condições de aplicação das soluções, além de promover uma maior divulgação deste método como uma técnica adicional a higienização convencional, a fim de atingir aperfeiçoamento para sua plena aplicação industrial.

 

Referências

  • CHOI, NY, BAEK, SY, YOON, JH, CHOI, MR, KANG, DH, & LEE, SY. Efficacy of aerosolized hydrogen peroxide-based sanitizer on the reduction of pathogenic bacteria on a stainless steel surface. Food Control, v. 27, n. 1, p. 57-63, 2012.
  • KRISHNAN, J., FEY, G., STANSFIELD, C., LANDRY, L., NGUY, H., KLASSEN, S., & ROBERTSON, C. Evaluation of a dry fogging system for laboratory decontamination. Applied Biosafety, v. 17, n. 3, p. 132-141, 2012.
  • PARK, S.-H., CHEON, H.-L., PARK, K.-H., CHUNG, M.-S., CHOI, S.H., RYU, S., KANG, D.-H. Inactivation of biofilm cells of foodborne pathogen by aerosolized sanitizers. International Journal of Food 154, 130-134. 2012.
  • SALUSTIANO, V.C., JOSÉ DE ANDRADE, N., CARDOSO BRANDÃO, S.C., JUNIOR, W.M., NACIFE, G.P. An assessment of chemical sanitizers on the microbiological profile of air in a milk processing plant. Journal of food safety 24, 159-167. 2004.

WOOD, J.P., CALFEE, M.W., CLAYTON, M., GRIFFIN-GATCHALIAN, N., TOUATI, A., EGLER, K. Evaluation of peracetic acid fog for the inactivation of Bacillus anthracis spore surrogates in a large decontamination chamber. Journal of hazardous materials 250, 61-67. 2013.

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