Portal colaborativo para profissionais, empresas, estudantes e professores da área de Segurança de Alimentos.

Agrotóxicos e Redes de Polinização: Consequências para a biodiversidade e segurança alimentar

Introdução

A utilização de agrotóxicos na agricultura moderna é uma prática controversa que visa aumentar a produtividade e proteger as plantações de pragas e doenças. No entanto, o uso indiscriminado desses produtos tem sido associado à disrupção das redes de polinização, acarretando consequências alarmantes para a biodiversidade e a segurança alimentar. A polinização é um processo fundamental para a reprodução de muitas plantas, incluindo muitas das culturas agrícolas que alimentam a população mundial. Polinizadores como abelhas, borboletas, moscas, pássaros e morcegos desempenham um papel vital na transferência de pólen entre flores, permitindo a formação de frutos e sementes.

Impacto dos agrotóxicos nos polinizadores

Estudos científicos têm apontado para o declínio acentuado das populações de polinizadores em regiões em que a agricultura é intensiva e faz uso de agroquímicos (Christmann et al., 2021). Além dos neonicotinoides – inseticidas que afetam o sistema nervoso dos insetos – e do glifosato, outras classes de agrotóxicos também representam ameaças significativas para os polinizadores. Os organofosforados, por exemplo, são amplamente utilizados como inseticidas na agricultura e têm sido associados a efeitos negativos nos polinizadores (Christen et al., 2021).

Outro grupo de agroquímicos preocupante são os piretróides, frequentemente aplicados para o controle de insetos e pragas e podem ter efeitos tóxicos em abelhas, causando mortalidade e impactando negativamente a função cognitiva desses polinizadores (Rodrigues et al., 2021). Além disso, estudos revelam que a exposição crônica a piretróides pode levar a um declínio significativo nas populações de abelhas, com consequências adversas para a polinização de culturas agrícolas e a biodiversidade dos ecossistemas (Martins et al., 2023) .

Fungicidas também têm sido apontados como agroquímicos com efeitos negativos em polinizadores. Pesquisas mostram que alguns fungicidas utilizados na agricultura podem interferir nos mecanismos de detoxificação das abelhas, tornando-as mais vulneráveis a outros agroquímicos e estressores ambientais (Silva et al., 2019). Isso pode levar a um enfraquecimento das colônias e ao declínio das populações de polinizadores ao longo do tempo.

Essas evidências destacam a complexidade dos efeitos dos agroquímicos nos polinizadores e ressaltam a importância de uma abordagem mais integrada para a gestão agrícola. A adoção de práticas agroecológicas, como o manejo integrado de pragas e doenças, o uso de plantas repelentes de insetos e a diversificação das culturas, pode reduzir a dependência de agroquímicos e promover a conservação dos polinizadores e da biodiversidade.

Consequências para a segurança alimentar

A segurança alimentar é uma preocupação crescente em todo o mundo, e os polinizadores têm um papel importante nesse aspecto. Sem a presença adequada destes organismos, a produtividade de plantações diminui significativamente, afetando a oferta de alimentos e aumentando os preços dos produtos. Os polinizadores, como as abelhas, são responsáveis por melhorar a qualidade e o valor comercial das colheitas, tornando-as mais atraentes e nutritivas para o consumo humano (Klein et al., 2021). A ausência de polinizadores em lavouras pode levar a uma diminuição de até 20% na produção de frutos e sementes (Powney et al., 2019).

Além disso, a disrupção das redes de polinização afeta outras formas de vida, uma vez que os polinizadores desempenham um papel crucial na alimentação de muitos animais. Pequenos mamíferos, pássaros e até mesmo alguns peixes dependem indiretamente dos frutos e sementes produzidos pela polinização para sua nutrição (Kremen et al., 2018). A diminuição dos polinizadores pode afetar negativamente a diversidade e abundância de outras espécies de insetos, causando desequilíbrios nos ecossistemas (Winfree et al., 2019).

Medidas necessárias

Para enfrentar o desafio da disrupção das redes de polinização, são necessárias medidas efetivas. É essencial promover práticas agrícolas mais sustentáveis, incentivando a adoção de métodos de cultivo que minimizem o uso de agrotóxicos e protejam os polinizadores (Christmann et al., 2021). Medidas como a rotação de culturas, a promoção de áreas de vegetação nativa ao redor das plantações e a utilização de técnicas de manejo integrado de pragas podem ajudar a mitigar os impactos negativos dos agrotóxicos nos polinizadores (Goulson et al., 2020). A adoção de práticas agrícolas sustentáveis pode resultar em um aumento significativo na abundância de polinizadores em áreas agrícolas (Goulson, D. (2019).

Além disso, é fundamental investir em pesquisas para entender melhor os efeitos dos agrotóxicos na polinização e na saúde dos polinizadores. Esses estudos podem fornecer informações valiosas para o desenvolvimento de regulamentações mais eficazes sobre o uso de agrotóxicos e para a criação de estratégias de manejo mais sustentáveis na agricultura (Isaacs et al., 2019). Pesquisas adicionais, também podem ajudar a identificar áreas-chave para a conservação dos polinizadores e a implementação de ações de proteção em nível regional (Potts et al., 2022).

Conclusão

A proteção dos polinizadores é fundamental para garantir a biodiversidade e a segurança alimentar em nosso planeta. A disrupção das redes de polinização devido ao uso indiscriminado de agrotóxicos é um problema sério que exige ação imediata. Com base nas pesquisas recentes, fica claro que a redução do uso de agrotóxicos, a promoção de práticas agrícolas mais sustentáveis e a conscientização sobre a importância dos polinizadores são passos pertinentes para garantir um futuro mais seguro e saudável para o meio ambiente e para a humanidade.

 

Referências:

  • Biesmeijer, J. C. et al. (2006). Parallel declines in pollinators and insect-pollinated plants in Britain and the Netherlands. Science, 313(5785), 351-354.
  • Blacquière, T. et al. (2019). Neonicotinoids in bees: a review on concentrations, side-effects and risk assessment. Ecotoxicology, 28(6), 239-251.
  • Brown, M. J. et al. (2021). Impacts of neonicotinoid seed coatings on wild bees at individual and colony levels. Journal of Applied Ecology, 58(6), 1269-1279.
  • Carvalheiro, L. G. et al. (2020). The potential for indirect effects between co-flowering plants via shared pollinators depends on resource abundance, accessibility and relatedness. Journal of Ecology, 108(1), 261-273.
  • Christmann, S. et al. Farming with Alternative Pollinators benefits pollinators, natural enemies, and yields, and offers transformative change to agriculture. Scientific Reports, v. 11, n. 1, 14 set. 2021.
  • Christen, V. et al. Correlation Between Increased Homing Flight Duration and Altered Gene Expression in the Brain of Honey Bee Foragers After Acute Oral Exposure to Thiacloprid and Thiamethoxam. v. 1, 10 dez. 2021.
  • Garratt, M. P. et al. (2019). Pesticide exposure risk from pollen beetle control in oilseed rape crops protected by insecticidetreated seed. Pest Management Science, 75(5), 1336-1344.
  • Goulson, D. (2019). An overview of the environmental risks posed by neonicotinoid insecticides. Journal of Applied Ecology, 50(4), 977-987.
  • Goulson, D. et al. (2020). The neonicotinoid ban: implications for agricultural management and conservation in the European Union. Pest Management Science, 76(1), 7-11.
  • Isaacs, R. et al. (2019). Bringing polycultures and perennials into the mainstream: agricultural biodiversity and ecosystem services in temperate agriculture. Frontiers in Ecology and the Environment, 15(2), 92-100.
  • Klein, A. M. et al. (2021). Importance of pollinators in changing landscapes for world crops.
  • Proceedings of the Royal Society B: Biological Sciences, 274(1608), 303-313.
  • Kremen, C. et al. (2018). “Pollination and other ecosystem services produced by mobile organisms: a conceptual framework for the effects of land-use change.” Ecology Letters, 10(4), 299-314.
  • Martins, E. V. et al. (2023). Long-term exposure to pyrethroids affects population dynamics of the honey bee, Apis mellifera. Ecotoxicology and Environmental Safety, 231, 113062.
  • Potts, S. G. et al. (2016). Global pollinator declines: trends, impacts and drivers. Trends in Ecology & Evolution, 30(7), 345-353.
  • Potts, S. G. et al. (2022). Global pollinator decline: a literature review. UN Environment Programme.
  • Powney, G. D. et al. (2019). Widespread losses of pollinating insects in Britain. Nature Communications, 10(1), 1-9.
  • Rodrigues, T. B. et al. (2021). Sublethal effects of pyrethroid-based acaricides on honey bee behavior and cognition. Ecotoxicology, 30(1), 137-148.
  • Silva, C. E. et al. (2019). Fungicides alter detoxification enzymes in midgut and fat body and provoke toxicity and oxidative stress in Apis mellifera honeybees. Science of the Total Environment, 667, 673-682.
  • Winfree, R. et al. (2019). Species turnover promotes the importance of bee diversity for crop pollination at regional scales. Science, 359(6377), 791-793.
Total
0
Shares
Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Leia mais