Portal colaborativo para profissionais, empresas, estudantes e professores da área de Segurança de Alimentos.

O uso de resíduos da produção de lácteos para desenvolvimento de produtos

Segundo o Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (RIISPOA), de 2017, a definição de leite é: “Entende-se por leite, sem outra especificação, o produto oriundo da ordenha completa e ininterrupta, em condições de higiene, de vacas sadias, bem alimentadas e descansadas”. O leite de outros animais precisa denominar-se segundo a espécie de que proceda (BRASIL, 2017).

O descarte de grandes volumes de resíduos, dejetos industriais e orgânicos têm gerado a poluição dos rios, lagos, zonas costeiras e baías, agenciando a degradação ambiental com impactos eutróficos rigorosos sobre a fauna, a flora e aos próprios seres humanos (RATTNER, 2009).

Produtos lácteos possuem alta influência na economia de indústrias alimentícias e serve de renda para produtores familiares, além de serem produtos que estão presentes em grande parte das casas brasileiras, independente da classe social. A produção de leite no país em 2020 foi de aproximadamente 35 bilhões de litros (EMBRAPA, 2021). 

De acordo com uma pesquisa aplicada pelo IBGE, os brasileiros consomem, em média, 32,2kg de produtos lácteos por ano. Dentre os mais consumidos estão o leite fluido, queijos e iogurtes (Siqueira, 2021). No decorrer dos anos houve um acréscimo na produção de produtos lácteos, logo foi necessária a criação de normas e legislações regulamentadoras quanto à quantidade de eluentes gerados nos laticínios, trazendo novas responsabilidades fiscais às indústrias lácteas quanto à preservação do meio ambiente e a descartes adequados dos resíduos (Bernardi, 2020). 

O soro de leite é um subproduto da indústria queijeira e é altamente danoso ao meio ambiente se destinado de forma incorreta, ou seja, quando ele está no estado in natura e é lançado no solo e/ou nos corpos hídricos, este efluente é considerado cem vezes mais poluente que os esgotos domésticos (COSTA et al., 2014; PAULA et al., 2012). 

Nas unidades produtoras de lácteos, o soro de leite é um subproduto gerado diariamente (Figura 1 e 2), com altos valores nutritivos, representando 55% dos nutrientes do leite. Com grande presença de substâncias orgânicas no soro de leite, ele apresenta alta demanda bioquímica de oxigênio, que o torna um subproduto poluente, o que é bastante grave, pois estima-se que a cada um quilo de queijo produzido, cerca de 6 a 9 litros de soro são gerados (Pinheiro, 2020. Lupki, 2019). As proteínas presentes se encontram em concentrações reduzidas no soro líquido; para tornar a sua reutilização mais eficiente são necessárias algumas etapas para concentração das propriedades, assim as propriedades funcionais se tornam ainda mais importantes, como por exemplo, os índices solubilidade e emulsificação (PAGNO, 2009).

Figura 1. Corte de massa de queijo para dessoragem / Fonte: Arquivo Pessoal

Figura 2. Separação de massa com o soro, para demonstração de rendimento. / Fonte: Arquivo Pessoal

O soro de leite é o resíduo lácteo de maior impacto ambiental das indústrias de laticínios (AHMAD et al., 2019). Alguns tratamentos são conhecidos, mas são opções que exigem alto custo de implantação e disponibilidade de área para construção e, normalmente, baixa eficiência, o que gera a ação por novas alternativas (Ferraz, 2021).

As proteínas presentes no soro de leite se destacam por apresentarem propriedades funcionais, como formação de espuma, emulsificação e solubilidade, fatores importantíssimos na aplicação e desenvolvimento de produtos. Alguns estudos vêm sendo desenvolvidos com o intuito do reaproveitamento, com propriedades nutricionais agregadas e aceitação sensorial. Rodrigues et al., (2018) desenvolveu sorvete com adição da proteína de soro, da Costa et al., (2022) biscoito amanteigado sem glúten adicionado de soro de leite e casca de beterraba e Duarte et al., (2020) pão doce com substituição da água utilizada na fabricação da massa por soro de leite.

Devido à concentração proteica do soro, pesquisas vêm sendo realizadas para demonstrar a aplicação do seu uso (Tabela 1), principalmente no desenvolvimento de bebidas proteicas (Bernardi, 2020).

Tabela 1. Tipos de propriedades conferidas a alimentos pela adição de concentrados proteicos de soro de leite. / Fonte: Bernardi (2020)

O leitelho é um coproduto nutritivo obtido a partir da fabricação de manteiga que muitas vezes é descartado, apresenta todos os componentes hidrossolúveis do creme, como,

proteínas, lactose, minerais e alguns componentes da membrana do glóbulo de gordura do leite. Abrindo um leque de possibilidades para a sua aplicação em produtos, como por exemplo bebidas lácteas fermentadas, conforme realizado por Santos et al., (2022).

É evidente que recentemente tem se desenvolvido uma constante preocupação em minimizar os impactos ambientais provocados pelas indústrias alimentícias. A diminuição dos resíduos, e o descarte adequado dos mesmos, são pontos focais frequentes nas industrias lácteas , bem como, o aproveitamento de subprodutos para desenvolvimentos de produtos, agregação de valores nutricionais, sensoriais e redução dos danos ambientais.  

 

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 

  • BERNARDI, Franciele. Soro de leite: alternativas para o processamento do subproduto. 2020.
  • BRASIL. Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (RIISPOA). Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 29 mar 2017.
  • COSTA, C. M.; et., al. Soro do leite e os danos causados ao meio ambiente. X Encontro Brasileiro sobre adsorção, Guarujá – SP, 2014. 
  • Da Costa, A. J. P., Prigol, A. V. B., Dezini, J. C., De Sa, K. Q., De Lima, K. G., Fagundes, Silveira, M. S., Benazzi. T. L., Biscoito amanteigado sem glúten adicionado de soro de leite e casca de beterraba. Anais da Feira de Ciência, Tecnologia, Arte e Cultura do Instituto Federal Catarinense do Campus Concórdia, v. 5, n. 1, p. 47-47, 2022.
  • Duarte, F. O., Duarte, A. C. O., Bemfeito, R. M., Oliveira, E. M., & Gonçalves, R. A. (2020). Análise sensorial de pão doce enriquecido com farinha de orapro-nóbis, soro de leite e farinha de quinoa.Revista Conexão Ciência, 15(2), 38-50
  • EMBRAPA Gado e Leite. Anuário leite 2021: saúde única e total. 2. ed. São Paulo. 2021. Disponível em  <embrapa.br/gado-de-leite>. Acesso em 05 de agosto de 2023.
  • Ferraz, Karin da Costa Ribeiro. “Uso agrícola de soro de leite: efeitos no solo, na emissão de CO 2, na biomassa microbiana do solo e na produção vegetal.” (2021).
  • LUPKI, Fernanda Barbosa et al. Efeito do PH nas propriedades tecnológicas de concentrado proteico de soro de leite. Brazilian Journal of Development, v. 5, n. 11, p. 23036-23059, 2019.
  • PAGNO, C. H. et al. Obtenção de concentrados proteicos de soro de leite e caracterização de suas propriedades funcionais tecnológicas. Alimentos e Nutrição, Araraquara, v. 20, n. 2, p. 231-239, 2009.
  • PAULA, J. C. J.; et al. Aproveitamento de soro de queijo de coalho na elaboração de bebida láctea pasteurizada. Artigo Técnico Revista do Instituto de Laticínios Cândido Tostes, v.67, n.387, 2012. Disponível em:. http://www.revistadoilct.com.br/rilct/article/view/246 Acesso em: 20 de setembro de 2023
  • PINHEIRO, Ana Carolina Guedes. Efeito do soro de leite em culturas produtoras de exopolissacarídeos. 2020. Trabalho de Conclusão de Curso. Brasil.
  • RATTNER, H. Meio ambiente, saúde e desenvolvimento sustentável. Ciência & Saúde Coletiva, v.14, n.6, p.1965-1971, 2009.
  • SANTOS, H. C. et al. Leitelho como alternativa sustentável para produção de produto lácteo fermentado tipo iogurte grego: avaliação sensorial com consumidores. 28° Congresso Brasileiro de Ciência e Tecnologia de Alimentos. 2022
  • SIQUEIRA, Kennya B. Um retrato do consumo de lácteos no Brasil. 2021.
  • Rodrigues, J., Bezerra, J. R. M. V., Teixeira, A. M., & Rigo, M. (2018). Avaliação sensorial e físico-química de sorvete com polpa de açaí e proteína do soro do leite. Revista Ambiência, 14(2), 225-236.
Total
0
Shares
Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Leia mais