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Aproveitamento do líquido residual da indústria de leite: o soro de leite

De resíduo à matéria-prima

Os resíduos orgânicos representam cerca de 50% dos resíduos urbanos gerados no Brasil, sendo que a maioria vem do setor de alimentação, impulsionado pelo crescimento populacional. Conforme o relatório What a Waste 2.0: A Global Snapshot of Solid Waste Management to 2050, o Brasil está em quarto lugar considerando os maiores produtores de lixo no mundo, onde os Estados Unidos, China e Índia ocupam o primeiro, segundo e terceiro lugar, respectivamente.

É de conhecimento de todas as indústrias a importância em cumprir com as legislações vigentes, porém, o reaproveitamento do soro de leite engloba assuntos como a responsabilidade ambiental e social. Sendo assim, é necessário analisar opções de destinação que sejam ambientalmente sustentáveis e baseadas na teoria dos “R” (reduzir, reutilizar e reciclar), tendo como consequência uma melhora da imagem institucional das empresas, marcas e produtos junto a seus públicos de interesse.

A indústria de laticínios é um exemplo desse setor, pois durante as operações de limpeza no processamento gera um grande volume de efluente com uma elevada carga orgânica, sendo constituída basicamente de leite (tanto matéria-prima quanto derivados) e contendo uma elevada Demanda Química de Oxigênio (DQO), Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO), óleos graxos, nitrogênio e fósforo. Além disso, o sistema de limpeza automática – CIP (Cleaning In Place) – descarta águas de enxágue com pH que varia de 1,0 a 13,0, tornando mais difícil o tratamento desses efluentes. No Brasil, basicamente metade do soro de leite que é produzido acaba sendo descartado sem o devido tratamento, provocando problemas no meio ambiente, tendo em vista as quantidades significativas de lactose e proteínas e o alto valor de investimento necessário para as estações de tratamento de efluentes.

Dados da Associação Brasileira das Indústrias de Queijos indicam que a produção anual de queijos no mundo, em 2019, foi de 26 milhões de toneladas, enquanto que, no mesmo ano, a Associação Brasileira de Supermercados declarou que o Brasil produziu cerca de 1,2 milhões de toneladas por ano, o que corresponde à produção de aproximadamente 480 mil toneladas de soro de leite por ano.

Apesar da indústria utilizar como uma das principais opções de aproveitamento do soro de leite a produção de bebidas lácteas, ainda se trata de um percentual reduzido, equivalente a 15% de todo o soro produzido, tornando-se realidade a incorporação deste às águas residuais das indústrias, sendo a principal fonte poluidora desse setor. 

Na teoria, a indústria de lacticínios poderia minimizar os impactos ambientais através da otimização e controle dos processos industriais, a fim de efetivar a utilização adequada dos subprodutos gerados no processo produtivo como o soro de leite. O desperdício, bem como o valor nutritivo do soro de leite, desperta a necessidade de estudos científicos sobre o tema, para a criação de alternativas economicamente viáveis com o aproveitamento do soro de leite e, consequentemente de sua carga orgânica de alto valor nutricional, tais como as proteínas, gordura residual e, principalmente, a lactose, principal responsável pelo impacto causado nos mananciais.

O fato de o soro de leite ser visto como resíduo, ao invés de matéria-prima, dificulta o seu correto aproveitamento dentro da indústria de laticínios, pois não há uma preocupação em manter a conservação e estabilidade do produto, através do uso de baixas temperaturas ou concentração para garantir sua qualidade após o processamento do leite. Além das propriedades nutricionais, as proteínas do soro do leite são de grande interesse pelas propriedades funcionais tecnológicas como ingredientes em produtos alimentícios, tendo em vista a elevada solubilidade e capacidade de geleificação.

Exemplos de alternativas para aproveitamento do soro de leite nos laticínios seria a sua utilização na fabricação de ricota, bebida láctea, soro concentrado, soro em pó e lactose. Além disso, há estudos com filmes à base de proteína de soro de leite que retardam o processo de deterioração, onde os mesmos são comestíveis, autônomos, que atuam como transportadores de compostos antimicrobianos, podendo ser utilizado em combinações com outros compostos para melhoramento das propriedades do filme e utilizado em substituição ao plástico comum.

 

REFERÊNCIAS

ABIQ – Associação Brasileira das Indústrias de Queijos. Mercado global de queijos bate recorde em 2019. 2021. Disponível em: <https://www.abiq.com.br/noticias_ler.asp?codigo=2373&codigo_categoria=6&codigo_subcategoria=5#:~:text=> Acesso em: 28 jul. 2022.

ABRAS – Associação Brasileira de supermercados. Com 25% da produção nacional, MG aposta no queijo como saída para crise e geração de renda. 2019. Disponível em: <https://www.abras.com.br/clipping/geral/67836/com-25-da-producao-nacional-mg-aposta-no-queijo-como-saida-para-crise-e-geracao-de-renda#:~:text=> Acesso em: 28 jul. 2022.

KAZA, Silpa et al. What a waste 2.0: a global snapshot of solid waste management to 2050. World Bank Publications, 2018. Disponível em: <https://openknowledge.worldbank.org/handle/10986/30317> Acesso em: 28 jul. 2022.

MARQUARDT, Liliane et al. Indústrias lácteas: alternativas de aproveitamento do soro de leite como forma de gestão ambiental. Tecno-Lógica, v. 15, n. 2, p. 79-83, 2011. Disponível em: <https://online.unisc.br/seer/index.php/tecnologica/article/view/2350> Acesso em: 28 jul. 2022.

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