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A alimentação como estratégia de melhora da resposta imunológica frente a infecção pelo SARS-Cov-2

Vírus que causam doenças respiratórias, como o SARS-Cov-2, causador da COVID-19, infectam seus hospedeiros pelo contato com as mucosas de vias aéreas. O hospedeiro tentará a todo custo evitar a infecção, fazendo uso do sistema imunológico.

Em 11 de Março de 2020 a Organização Mundial de Saúde decretou a sexta pandemia desde a sua criação. Em menos de 5 meses a COVID-19 matou mais de 371.000 pessoas no mundo. Enquanto países europeus e asiáticos começam a se libertar da quarenta e de sistemas de lockdown, o Brasil ainda se encontra em um momento delicado. No Brasil mais de 530 mil casos foram confirmados, havendo até a última semana de maio/2020 mais de 30 mil mortes. Os números permanecem crescendo, indicando que provavelmente ainda estamos na expansão logarítmica do número de casos. Até o momento, a letalidade da COVID-19 tem sido majoritariamente associada a grupos de riscos como idosos e/ou pacientes com comorbidades como, por exemplo, cardiopatia, diabetes, doença renal, doença neurológica, pneumopatia, obesidade, imunodepressão e asma. Estudos (Brasil, 2019) relatam que entre os óbitos confirmados no Brasil por COVID-19, 69,3% tinham mais de 60 anos e 63,0% apresentavam pelo menos uma comorbidade como fator de risco. Dentre as comorbidades, a imunodepressão foi observada em torno de 4,1% de 31.199 óbitos, no entanto, vale ressaltar que pacientes que pertencem aos grupos de risco relatados acima podem ser também afetados pelo comprometimento do sistema imunológico.

Vírus que causam doenças respiratórias, como o SARS-Cov-2, causador da COVID-19, infectam seus hospedeiros pelo contato com as mucosas de vias aéreas. O hospedeiro tentará a todo custo evitar a infecção, fazendo uso do sistema imunológico. Inicialmente esse sistema responde com a imunidade inata, e essa será responsável por tentar conter a proliferação viral por meio de moléculas como defensinas, interferon e citocinas (já naturalmente presentes em nosso organismo), e através da captura de células infectadas pelo vírus por células especializadas (como as natural killers). Para os vírus que conseguem permanecer, mesmo após todo o ataque do sistema imune inato, ainda existe mais uma chance de eliminação, o sistema adaptativo. Nesse momento os vírus irão lidar com os anticorpos específicos formados pelo hospedeiro. Os anticorpos antivirais atuam principalmente como moléculas neutralizantes, para evitar a interação do vírus com a célula do hospedeiro.

Atualmente existem mais de 20 tratamentos para COVID-19, com drogas e combinações diversas, sendo avaliados em estudos controlados, seguindo parâmetros rígidos. Como os estudos multicêntricos internacionais Discovery e Solidarity. Mas apesar de tantas mortes mundiais, ainda não foi estabelecido nenhum protocolo medicamentoso para tratamento e/ou profilaxia. Neste momento contamos apenas com protocolos paliativos, que visam diminuir os sintomas, quando estes já aparecem, tentando manter um quadro clínico controlado e estável durante o curso da doença.

Se o consumo de alimentos e/ou uso de nutracêuticos, auxiliam, ou não, no combate, ou prevenção, da COVID-19 ainda não sabemos. Conforme relatos da OMS, não há comprovação científica de estratégias terapêuticas baseadas em medicamentos naturais, ou alimentos, para prevenir a incidência, ou a gravidade, da infecção por SARS-CoV-2. Entretanto, a comunidade científica vem se baseando em resultados de estudos anteriores, realizados em pacientes acometidos por outras infecções virais, que indicam melhora no estado nutricional, e na resposta imune, relacionados aos alimentos consumidos, que promoveram redução no tempo de duração da doença.

É importante destacar que o padrão alimentar também é importante e está associado ao condicionamento de um sistema imunológico mais eficiente, com menor risco de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) como obesidade, diabetes e hipertensão, todas consideradas comorbidades de risco quando associadas à COVID-19, sendo que a obesidade vem sendo apontada como o fator de risco mais relacionado à morte de jovens.

Institute for Functional Medicine recentemente escreveu um documento que orienta a suplementação de compostos bióticos e nutrientes com recomendações e formas de consumo à pacientes acometidos pela COVID-19. O documento relata que tais nutrientes estão envolvidos na melhora da resposta imunológica, uma vez que estes podem auxiliar na capacidade do corpo em combater e se recuperar da doença. Entre os compostos e nutrientes relatados nesse documento, configura-se como os mais importantes a curcumina, quercetina, epigalocatequinagalato e resveratrol, além dos nutrientes zinco, vitamina D, vitamina A e Vitamina C. Além desses nutrientes, outros estudos também citam os ácidos graxos ômega-3, vitamina B, ferro, magnésio e cobre como auxiliares na melhora da resposta inflamatória.

​ No Brasil, o Conselho Federal de Nutrição, bem como outros órgãos da saúde, vem orientando a população para uma alimentação baseada no Guia Alimentar da População Brasileira, no qual é incentivado o consumo de alimentos in natura e minimamente processados como forma de garantia da manutenção da saúde, em detrimento ao consumo de alimentos ultraprocessados. Segundo esses órgãos, alimentos in natura (legumes, hortaliças e frutas) são fontes de compostos bioativos, vitaminas e minerais com potentes propriedades anti-inflamatórias e antioxidantes que podem auxiliar na melhora da imunidade. Em contrapartida, o consumo de alimentos ultraprocessados, pobres em nutrientes, ricos em gorduras e açúcares, está associado com a principal causa das comorbidades responsáveis pelo aumento do risco de doença grave ou óbitos por COVID-19, além de interferirem negativamente na resposta inflamatória de indivíduos que não possuem comorbidades pré-existentes. Em outros países, a dieta mediterrânea, caracterizada por uma ingestão relativamente alta de frutas, legumes, azeite, grãos integrais, nozes e gorduras monoinsaturadas, laticínios fermentados, peixe, aves, vinho, e baixa quantidade de óleos refinados, carnes e alimentos processadas vem sendo aconselhada por especialistas por conter propriedades anti-inflamatórias e imunomoduladoras (vitaminas C, D e E e minerais zinco, cobre, cálcio, etc.).

Confira os principais alimentos, compostos bioativos e nutrientes associados ao efeito benéfico da resposta imunológica no combate à COVID-19:

Frutas e vegetais

Apresentam benefícios potenciais em associação com condições respiratórias e inflamatórias devido ao seu perfil nutritivo, composto por antioxidantes, vitaminas, minerais e fitoquímicos, que incluem compostos fenólicos que atuam como antioxidantes e anti-inflamatórios.

Alho

Estudos demonstram que o alho fresco e o extrato de alho envelhecido e suplementos de alho podem reduzir a gravidade da infecção respiratória superior viral e previne infecções por vírus que podem causar resfriados.

Mel

Possui propriedades antioxidantes e antimicrobianas, atuando no alívio de dores e inflamações das mucosas, tosses e dores de garganta.

Probióticos

Possui microrganismos vivos que agem influenciando a microbiota intestinal em um aumento da resistência contra patógenos, estimulando a multiplicação de bactérias benéficas o que promove o aumento da imunidade. Estudos demonstram que probióticos podem diminuir o número de infecções respiratória, principalmente em crianças.

Ácido graxos ômega-3

Estudos mostram que atuam na melhora da inflamação e lesão pulmonar.

Selênio

Possui ação essencial na função imunológica e antioxidante que ajudam a aumentar as defesas do organismo contra bactérias, vírus e células cancerígenas. O aporte nutricional pode ser facilmente adquirido pelo consumo de alimentos de fontes deste mineral, como as castanhas.

Vitamina A

Pode apoiar a capacidade do organismo no combate de infecções respiratórias.

Vitamina C

Pode ajudar a prevenir infecções, incluindo as causadas por bactérias e vírus. Estudos demonstraram que a vitamina C administrada regularmente diminui a duração dos resfriados e doses mais altas de vitamina C durante uma doença também pode atuar com anti-histamínico e anti-inflamatório natural.

Vitamina D

Contribui para o sistema imunológico, reduzindo riscos de gripes e resfriados. A vitamina D parecem regular a produção de proteínas antimicrobianas específicas que matam diretamente os patógenos e, provavelmente ajudarão a reduzir a infecção, inclusive nos pulmões

Zinco

O zinco tem ação comprovadas na redução de infecções, reduzindo a duração e gravidade de resfriados.

Quercetina

Encontrada em frutas e vegetais, possui uma ampla gama de benefícios. Estudos evidenciaram o seu consumo na diminuição da replicação viral de SARS-CoV.

Resveratrol

Composto natural encontrado em uvas, atua melhorando a resposta imune no combate a COVID-19.

Curcumina

Estudos demonstraram que a curcumina reduz a inflamação e atividade viral do COVID-19

 

No momento, seguir uma alimentação saudável, que forneça a ingestão de acordo com as necessidades diárias é a estratégia mais eficiente e recomendada no suporte à função imunológica. No entanto, pessoas com deficiência de alguns micronutrientes, podem requerer suplementação ou modificação de seus padrões alimentares, para manter um estado nutricional e apoiar a função imunológica saudável em tempos de pandemias originadas pelo vírus SARS-CoV-2. É necessário ressaltar, que toda suplementação nutricional deve ocorrer sob a orientação de um nutricionista ou médico e que não existe um superalimento que sozinho possa ser utilizado como uma medida terapêutica à COVID-19.

 

Referências:

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