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Experiências no Pescado: relatos de especialistas na área | parte 4

A oceanógrafa e Analista de Recursos Pesqueiros da Fiperj, Francyne Carolina dos Santos e a coordenadora do Programa de Pós Graduação em Higiene e Processamento Tecnológico de POA da Universidade Federal Fluminense, Eliane Teixeira Mársico compartilharam suas experiências

Esta é a quarta parte do quadro “Experiências no pescado”, criada pelo curador da série Dia de Pescado, do Portal e-food, André Medeiros. Nesta quarta parte convidamos a oceanógrafa, engenheira ambiental e Analista de Recursos Pesqueiros da FIPERJ, Francyne Carolina dos Santos. “A Fran é a minha base pessoal de dados do pescado, sempre disposta a auxiliar com tais informações estatísticas, principalmente do Rio de Janeiro – fundamentais para realizar gestão sustentável nos recursos pesqueiros, por exemplo”, diz André. O segundo relato fica por conta da doutora em Ciência de Alimentos e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Higiene e Processamento Tecnológico de POA da Universidade Federal Fluminense, professora Eliane Teixeira Mársico. “Uma grande mestre e pesquisadora, sempre uma referência para mim em controle físico-químico, especialmente em metais tóxicos no pescado. Ela, inclusive, defende a ideia de que o consumidor deve exigir ações políticas que coíbam a presença de moléculas tóxicas silenciosas na sua comida”, conta o curador.

“Meu foco foi construir um histórico de dados, para que o Rio de Janeiro pudesse participar ativamente da gestão pesqueira regional e nacional” – Francyne Carolina dos Santos

“Meu primeiro contato profissional com a cadeia produtiva da pesca foi durante uma visita técnica para coleta de amostra de pescado numa indústria beneficiadora, durante meu primeiro estágio no Laboratório de Bioquímica Marinha. Eu participava de uma pesquisa que investigava geneticamente a identificação das espécies de atuns e afins.

Nos anos finais da graduação, mudei para o Laboratório de Pesca Artesanal para escrever a monografia de conclusão do curso. Tive acesso aos dados históricos de desembarque pesqueiro coletados pelo CEPERG/IBAMA, que estavam armazenados em livros preenchidos a mão, e me debrucei a digitar três décadas de dados de produção dos três principais recursos pesqueiros da região.

Correlacionei as safras de tainha, corvina e bagre com fatores climáticos e abióticos (El Nino, La Nina, temperatura superficial do mar, salinidade e precipitação pluviométrica), graças aos bancos de dados existentes e disponíveis, ainda no início da internet nas nossas vidas!

Cheguei ao Estado do Rio de Janeiro alguns anos depois de formada e me deparei com indústrias de pesca em Cabo Frio que eram mais antigas do que os marcos regulatórios de meio ambiente, e que não possuíam licença ambiental estadual para operar. Trabalhei no licenciamento operacional de uma dessas indústrias, até ingressar na Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro – Fiperj como coordenadora de pesca marinha. 

Descobri que o estado não realizava o monitoramento da pesca como eu conhecia em outros estados do sudeste e sul, e meu foco passou a ser construir um histórico de dados, para que o Rio de Janeiro pudesse participar ativamente da gestão pesqueira regional e nacional. Hoje, passada uma década, nossa fundação tem quatro anos de informações que estão embasando modificações de legislações antigas e criação de novas, para aprimorar a atuação do setor. Ainda há muito que se trilhar, mas muitos passos já foram dados!”

A importância de falar sobre os contaminantes químicos nos alimentos – Eliane Teixeira Mársico

“Trabalhar por mais de 20 anos na área de contaminantes químicos em alimentos e mais especificamente com elementos traço, me traz a certeza do verdadeiro sentido da existência do invisível, do invisível danoso, que pode acarretar graves consequências na saúde da população, no silêncio da sua presença. São moléculas que podem estar presentes em traços (ppm, ppb, ppt), em várias matrizes alimentares, tanto de origem animal quanto vegetal; naquela que comemos e achamos “deliciosa”, naquela que comemos e achamos “natureba” e consequentemente, “saudável”, naquilo que bebemos e até no ar que respiramos.

O trabalho da ciência é dinâmico, incansável, responsável e com autonomia para apresentar alertas das possíveis consequências da ação antropogênica sobre a qualidade química dos alimentos. Desta forma, também é uma atividade política, que tenta nortear e dar um direcionamento às ações que balizam a segurança dos alimentos inserida no contexto da segurança alimentar. Costumo, como médica veterinária e cientista, dizer que nossa atividade proativa de hoje, é responsável pela qualidade de vida das próximas gerações.

O alerta que nos cabe e não deve se calar é: exija, como consumidor, qualidade; exija ações políticas que coíbam a presença de moléculas tóxicas silenciosas na sua comida. De nada vale alimentar quantitativamente hoje com a certeza dos danos silenciosos, em especial a carcinogênese. As doenças mal definidas da população contemporânea (alguns tipos de câncer, Mal de Alzheimer, demências senis, mal de Parkinson , etc) podem, à luz da ciência, ser atribuídas a presença de vários elementos traço tóxicos como mercúrio (Hg), Pb (chumbo), arsênico (As), cádmio (cd), pesticidas, componentes de embalagens, poluentes orgânicos persistentes (POPs) etc, alguns desses conhecidos pela humanidade desde épocas muito remotas, estudados pelos cientistas há muitos anos, desconhecido por grande parte da população e, muitas vezes,  desconsiderado pelas políticas públicas que visam a garantia da inocuidade dos alimentos.”

Outros relatos já publicados no Portal e-food

Experiências no Pescado: relatos de especialistas na área | parte 1

Experiências no Pescado: relatos de especialistas na área | parte 2

Experiências no Pescado: relatos de especialistas na área | parte 3

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