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Utilização da casca de ovos na alimentação como fonte alternativa de cálcio

O cálcio é um micronutriente essencial para o corpo humano, sendo importante para o crescimento e manutenção dos ossos e dentes, além de auxiliar na coagulação sanguínea, contração muscular e transmissão do impulso nervoso (MARTINI & PETERS, 2017). Sua deficiência pode ocasionar o desenvolvimento de osteoporose e fraturas após queda. Além disto o cálcio é um dos micronutrientes importantes para prevenir o nanismo, e o sistema imunológico pode atuar como um segundo mensageiro dos linfócitos para manter a resposta imunológica do corpo (MAS’UDAH et al., 2023). 

A osteoporose é um grande problema de saúde pública que afeta milhões de pessoas em todo o mundo e resulta em custos econômicos significativos. A condição é caracterizada por alterações na homeostase óssea, que levam à redução da massa óssea, comprometimento da qualidade óssea e aumento do risco de fraturas (ADEJUYIGBE et al., 2023).

A população em grande maioria associa a ingestão de leite com a ingestão de cálcio, mas em 1 copo de 200 ml de leite possui 240 mg de cálcio, que fica muito abaixo da recomendação da ingestão diária pela DRIS (Dietary Reference Intakes), que é de 700 a 1.300 mg diários conforme idade e sexo. 

Os grandes volumes de ovos explorados, tanto a nível industrial como doméstico, para fabricar e processar alimentos ou servir como fonte de nutrição geram inevitavelmente resíduos de casca de ovo que muitas vezes são descartados. O descarte de cascas de ovos em aterros é caro e ocupa espaço, além de produzir metano – um poderoso gás de efeito estufa que contribui para o aquecimento global (ADITYA et al., 2021). Uma opção para aumentar as fontes de cálcio na dieta é a farinha da casca de ovo, que pode enriquecer diversos alimentos e pode ser utilizada como fonte alternativa deste mineral; além disso diminuirá a quantidade de resíduos descartados nos aterros sanitários e colaborando com a queda na poluição do meio ambiente. As cascas dos ovos são uma excelente fonte de cálcio que tem a capacidade de ser utilizada pelos humanos segundo WAHEED et al. (2019).

Para Raghul (2023), o aumento do consumo de ovos de galinha resulta em um enorme volume de resíduos de casca de ovo, o que tem impacto ambiental, como exemplificado na figura 1. No âmbito da valorização de resíduos, as cascas de ovos podem ser utilizadas como fonte de suplementação de cálcio em diversos produtos alimentares. os resíduos de cascas de ovos podem ser convertidos em produtos valiosos para o consumo humano, o que poderia aliviar o seu impacto ambiental (WAHEED et al., 2020).

Figura 1: Geração de resíduo de casca de ovo. Fonte: Autoria Própria.

A casca de um ovo equivale a 10% de seu peso, ou seja, 1 ovo de 55g tem aproximadamente 5g de casca (ARAUJO & ALBINO, 2017).  As cascas são descartadas em aterros, ou aplicadas ao solo, mas uma alternativa é o processamento e comercialização da mesma como um suplemento mineral.  

A casca do ovo é composta por substâncias orgânicas e inorgânicas. Quando in natura, é composta por carbonato de cálcio na forma de calcita (94% em massa), fosfato de cálcio (1% em massa), carbonato de magnésio (1% em massa) e matéria orgânica (4% em massa), conforme KUMAR et al., (2022). A película interna que forma o revestimento da casca consiste na parte orgânica que é formada por glicoproteínas, mucoproteínas, colágeno e mucopolissacarídeos, enquanto compostos como CaCO3, MgCO3 e Ca3(PO4)2 formam a parte inorgânica. Que corrobora com a composição química da casca de ovo é composta por carbonato de cálcio, representada na forma de calcina (94% em massa), proteína (cerca de 4% em massa), carbonato de magnésio (1% em massa), fosfato de cálcio (1% em massa), matéria orgânica e água (CORREA et al., 2015).

A produção da farinha da casca de ovo é fácil, segura e sustentável, sendo uma fonte de nutrientes, podendo ser adicionada ao preparo de diversos alimentos. Possui a vantagem para quem tem maior seletividade com os alimentos, que de forma facilitada fará a ingestão do cálcio. O excesso desse mineral pode ser prejudicial à saúde, por isso o consumidor deve se atentar às orientações e exigências nutricionais para ingerir de forma correta, sem riscos à saúde.

Para a higienização das cascas (figura 2) são apresentados os parâmetros propostos pela INTERNATIONAL COMMISSION ON MICROBIOLOGICAL SPECIFICATION FOR FOODS. Seguindo o fluxograma abaixo, as cascas devem ser lavadas em água corrente, em seguida, deixar de molho em solução de hipoclorito de sódio por 10 minutos e ferver durante 10 minutos. Após isso, as cascas devem ser secas em forno elétrico a 150 °C, por 40 minutos, trituradas em liquidificador e armazenadas para consumo.

Figura 2: Fluxograma da Higienização das cascas. Fonte: Autoria Própria.

Para facilitar a ingestão, essa farinha fabricada da casca de ovos pode ser adicionada a receitas, como por exemplo, no preparo de pães, bolos e até sorvete. Pandolf et. al., (2022), a fim de simular uma produção caseira, desenvolveu de forma manual um pão integral, onde se adicionou 5 gramas de pó da casca do ovo para cada 100 gramas de farinha utilizada no preparo do pão, que não alterou as características iniciais do produto. O resultado foi um pão integral com 755 mg de cálcio, 40 vezes mais que o pão que não recebeu a adição do pó da casca de ovo, que possui em sua composição apenas 18,50 mg de cálcio. Para o preparo do sorvete, adicionou 5 gramas do pó da casca de ovo para cada 100 ml de leite utilizado no preparo; o resultado final foi um sorvete com 1.180 mg de cálcio, enquanto o sorvete sem adição do pó da casca do ovo possuía apenas 71,5 mg de cálcio. 

Utilizando a farinha da casca do ovo na fabricação de bolo de mel, Corá et. al., (2022), analisaram a incorporação de 2%, 5% e 10% do pó da casca de ovo, constatando que é possível a adição de até 10% em bolo de mel, obtendo-se um alimento adicionado de cálcio com maior maciez do que o produto padrão, mas o sabor foi alterado conforme maior era a adição do pó da casca de ovo. 

Ribeiro (2023), realizou o preparo do bolo muffin (figura 3) enriquecido com a farinha da casca de ovo, na qual parte da farinha de trigo foi substituída por farinha da casca de ovo, na concentração de 50 Kg de farinha de trigo e 1,2 Kg de farinha da casca de ovos. O resultado obtido foi de 173 mg de cálcio, em cada 60 g de bolo, mostrando ser uma estratégia promissora para aproveitar integralmente os alimentos e enriquecer nutricionalmente os bolos com o cálcio.

Figura 3: Bolo tipo muffin. Fonte: Confeitaria de sucesso (2023). Disponível em: https://www.confeiteiradesucesso.com/aprenda-fazer-cupcake/

Os trabalhos que testaram diferentes receitas citadas no texto, não encontraram contaminação microbiológica nos alimentos, mostrando que após a higienização o consumo é seguro, sendo livre de coliformes, estafilococos e salmonella. 

Encontrar formas de utilizar cascas de ovo para fins nutricionais e não nutricionais não só reduz o desperdício (figura 4), mas também proporciona vários benefícios económicos.

Figura 4: Aproveitamento dos Resíduos da casca. Fonte: Autoria Própria. 

 Portanto, a fabricação e o consumo da farinha da casca dos ovos é uma alternativa viável, funcional e sustentável, para suplementação de cálcio na alimentação humana, podendo ser utilizadas cascas de ovos brancos, caipira ou codornas, visto que na composição química das cascas não há diferenças significativas.  

 

Referências: 

  • ADEJUYIGBE, B.; KALLINI, J.; CHIOU, D.; KALLINI, J.R. Osteoporosis: Molecular Pathology, Diagnostics, and Therapeutics. Int. J. Mol. Sci. 2023, 24, 14583. https://doi.org/10.3390/ijms241914583
  • ADITYA, S., STEPHEN, J. and RADHAKRISHNAN, M. (2021), “Utilization of eggshell waste in calcium-fortified foods and other industrial applications: a review”, Trends in Food Science and Technology, Vol. 115, pp. 422-432, doi: 10.1016/j.tifs.2021.06.047.
  • ARAUJO, W. A. G; ALBINO L. F. T. Resíduos de incubatório: Disposição e aproveitamento. P. 140- 155, 2017.
  • BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 451, de 9 de junho de 2014.
  • CORÁ, J. G.; RIBEIRO, R. R.; FAVERO, T.; BISSIGO, I. C. T.; ARCARI, S. G. Bolo de mel adicionado de cálcio proveniente do pó da casca de ovo. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Tecnologia em Alimentos do Câmpus São Miguel do Oeste do Instituto Federal de Santa Catarina, 2022.
  • CORRÊA, T.H.A.; MANHÂES, R.S.T.; HOLANDA, J.N.F. Conversão de resíduo de casca de ovo galináceo. In: Encontro De Engenharia, Ciência De Materiais E Inovação Do Estado Do Rio De Janeiro, 1., 2015.
  • KUMAR, B. A; SAMINATHAN, R; THARWAN, M; VIGNESHWARAN, M; BABU, P. S; RAM, S; KUMAR, P. M. Study on the mechanical properties of a hybrid polymer composite using egg shell powder based bio-filler Mater. Today: Proc., 69 (2022), pp. 679-683, 10.1016/j.matpr.2022.07.114.
  • MARTINI L. A; PETERS, B. S. E. Cálcio e vitamina D: fisiologia, nutrição e doenças associadas. Barueri: Manole; 2017. 
  • MAS’UDAH, L., WIJAYA, D., RAHMITA, NA, & ​​RAHMAWATI, ONU (2023). Boba com alto teor de cálcio em cascas de ovos para prevenir o nanismo e estimular o sistema imunológico. Jurnal Sains Dan Kesehatan, 5 (2), 218–223. https://doi.org/10.25026/jsk.v5i2.1187
  • PANDOLFI, L; BRANCO, C. S; FACCO, E. M. P; CHILANTI, G. Utilização da casca de ovo de galinha como estratégia de aumento de cálcio em alimentos. Saúde Meio Ambient. Revista Interdisciplinar, v. 11, p. 59-70, 2022.
  • RAGHUL, M. WASTE VALORISATION OF CHICKEN EGG SHELLS AND DEVELOPMENT OF FORMULATED BISCUITS WITH EGG SHELL WASTE AS A SOURCE OF DIETARY CALCIUM. Food and Environment Safety Journal, [S.l.], v. 22, n. 1, apr. 2023. ISSN 2559 – 6381. Available at: <http://fens.usv.ro/index.php/FENS/article/view/951/841>. Date accessed: 20 nov. 2023.
  • RIBEIRO, R. M. Desenvolvimento de bolo muffin usando farinha da casca de ovo: uma abordagem sustentável. 62p. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Engenharia de Alimentos) – Departamento de Engenharia química, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2023.
  • WAHEED M., BUTT M.S., SHEHZAD A., ADZAHAN   N.M.,   SHABBIRM.A.,   SULERIA H.A.R., AADIL,  R.M.,  Eggshell  calcium:  Acheap alternative     toexpensive     supplements.Trends inFood   Science   and   Technology,   91:   219–230, (2019).
  • WAHEED, M; YOUSAF, M; SHEHZAD, A; RAHEEM, M. I. U; KHAN, M. K. I; KHAN, M. R; AHMAD, N; AADIL, A. R. M. Channelling eggshell waste to valuable and utilizable products: A comprehensive review, Trends in Food Science & Technology, Volume 106, 2020, Pages 78-90, ISSN 0924-2244, https://doi.org/10.1016/j.tifs.2020.10.009.

 

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